Zika: bebês podem apresentar sequelas até 2 anos após o nascimento

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 11 de julho de 2019 às 09:04
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 19:39
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Pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) vêm acompanhando 216 bebês nascidos entre 2015 e 2016 no país

Um estudo feito com
bebês de mulheres infectadas pelo zika na gestação mostra que um terço deles
registrou algum atraso no desenvolvimento até dois anos e oito meses após o
nascimento.

O achado indica que o
vírus pode provocar problemas neurológicos, visuais e auditivos mesmo em bebês
nascidos sem microcefalia ou qualquer outra anormalidade.

Responsáveis pelo estudo, os pesquisadores da
Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) vêm acompanhando 216 bebês nascidos entre 2015
e 2016 no país. Todos eles são filhos de mulheres que tiveram a infecção pelo
vírus confirmada em algum momento da gravidez.

De acordo com a pesquisa, publicada na revista
científica Nature Medicine, 68 das 216 crianças avaliadas (31,5%) tiveram
problemas neurológicos detectados no período de 7 a 32 meses de idade. “O
problema mais comum foi atraso no desenvolvimento da linguagem, mas observamos
também atrasos motores e cognitivos”, destacou a pediatra Maria Elisabeth
Moreira, pesquisadora da Fiocruz. “Nossa intenção é monitorar essas
crianças até a idade escolar”, destaca a médica.

De acordo com a especialista, embora não seja
possível afirmar que todos os casos de atraso sejam sequelas do zika, há uma
associação entre a infecção e os problemas no desenvolvimento. “Há outras
causas para atrasos no desenvolvimento, mas vemos uma associação porque temos
um grupo controle de bebês, de mães que não foram infectadas pelo zika, e,
nesse grupo, o índice de bebês com problemas no neurodesenvolvimento é de 15%,
metade do registrado no grupo de bebês de mães com zika”, explica ela.

Os resultados da pesquisa reforçam descobertas
feitas pelo mesmo grupo logo após o início da epidemia de zika e microcefalia
no país. Na época, os cientistas já verificavam que as sequelas da infecção
poderiam aparecer meses após o nascimento.

Agora, com as crianças mais velhas e a
possibilidade de um tempo maior de monitoramento, os cientistas concluem que o
aparecimento dos problemas pode ser ainda mais tardio.

Inverso

Os cientistas também acharam entre os bebês
monitorados casos inversos, ou seja, nos quais o bebê nasceu com alguma
anormalidade e se desenvolveu normalmente depois.

Do total de crianças acompanhadas, 49 apresentavam
algum problema logo após o nascimento, mas 24 delas (49%) tiveram avaliações
normais no segundo e terceiro anos de vida.

Entre os bebês com alguma anormalidade, oito haviam
sido diagnosticados com microcefalia. Destes, dois voltaram a ter um
crescimento cerebral adequado, sem apresentar, no decorrer do crescimento,
qualquer problema neurológico, motor, visual ou na linguagem.

Maria Elisabeth destaca que esses dois bebês
puderam ter uma boa evolução porque, embora tivessem perímetro cefálico abaixo
do adequado ao nascer, não tinham lesão cerebral, diferentemente da maioria dos
bebês com microcefalia.

Para a especialista, ambos os achados do estudo
reforçam a necessidade de monitoramento constante dessas crianças para detecção
de eventuais sequelas tardias e do início precoce das terapias de estimulação
para que eventuais anormalidades detectadas no nascimento possam ser revertidas
ou minimizadas.

Esse cenário, porém, ainda está longe de ser
alcançado no Brasil. De acordo com dados do Ministério da Saúde, dos 3,3 mil
bebês nascidos com má-formação causada pelo zika entre 2015 e 2018, só 35% têm
acesso à estimulação precoce.

Outro problema é a falta de recursos para pesquisas
que mostrem o impacto das terapias de estimulação nessas crianças.
“Precisamos de mais investimentos. Tentamos, mas não conseguimos
financiamento para essa pesquisa”, diz Maria Elisabeth.


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