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Pela primeira vez, comissão analisa todas autodeclarações de pretos e pardos ingressantes
A política de reserva de vagas em vigor na Unesp garantiu a presença de estudantes pretos e pardos ingressantes em 2019 em todos os 24 câmpus da Universidade, inclusive em cursos de alta concorrência, indica estudo recém-apresentado ao gabinete da Reitoria.
O Sistema de Reserva de Vagas para a Educação Básica Pública existente na Unesp destina metade das vagas da Universidade a egressos de escolas públicas e, desse conjunto, 35% são reservadas a estudantes que se autodeclaram pretos, pardos ou indígenas.
Criada no final de 2018 para fazer aferição da veracidade das autodeclarações de estudantes pretos e pardos, a Comissão Central de Averiguação verificou essas autodeclarações de todos os alunos que ingressaram na Unesp em 2019 por meio da aprovação no exame vestibular.
É a primeira vez que isso ocorre. Antes, como no caso da maior parte das universidades com ações afirmativas, a Unesp fazia tal verificação por meio de denúncias que chegavam à Ouvidoria, alterando em 2019 para a checagem universal dos ingressantes.
Foram analisadas todas as autodeclarações de estudantes pretos e pardos –cerca de 1.300 alunos ingressantes neste ano– em um trabalho que envolveu as Diretorias Técnicas Acadêmicas da Unesp das unidades universitárias.
Ao final das três primeiras fases do processo, quase 1.200 autodeclarações foram consideradas “consistentes” pela Comissão Central de Averiguação, depois de análise documental, entrevistas por videoconferência e entrevistas presenciais.
O trabalho agora passa pela Comissão de Avaliação Recursal, que analisa os recursos dos estudantes e pode fazer nova verificação presencial, e ainda por uma avaliação final do Gabinete da Reitoria.
O processo de averiguação praticado na Unesp respeita os princípios estabelecidos em acórdão do Supremo Tribunal Federal (STF) que norteia a matéria e leva em consideração para validar as autodeclarações as características fenotípicas, tais como pigmentação da pele e dos olhos, tipo de cabelo e forma do nariz e dos lábios.
“Nosso objetivo é procurar assegurar a efetividade da política pública, ou seja, o ingresso de pretos e pardos na universidade. Fomos sofisticando e melhorando todo o processo. A Universidade tem hoje a confiança de que esses alunos são pessoas que efetivamente atendem aos requisitos da política pública”, afirma o professor Juarez Tadeu de Paula Xavier, presidente da Comissão Central de Averiguação das autodeclarações.
“Mais pessoas dentro da Universidade se incorporaram ao processo (de averiguação), melhoramos a compreensão sobre a constitucionalidade da medida, compreendemos melhor quais são os critérios de heteroidentificação e as características fundamentais de fenotipia, e desenvolvemos procedimentos muito precisos para poder chegar aos objetivos que havíamos traçados. Asseguramos uma eficiente e segura forma de averiguação em uma universidade multicâmpus como a nossa”, diz o docente.
Uma mostra da efetividade do processo de averiguação das autodeclarações, na avaliação da comissão, foi o número de cancelamentos de matrícula pedidos ao longo das etapas do processo. Foram 93 casos de estudantes cujas autodeclarações estavam sendo consideradas inconsistentes que pediram para deixar a Universidade após iniciada a averiguação.
Se o aluno preto ou pardo tiver a autodeclaração considerada inconsistente ao final de todo o processo, ele passa a ser punível com o desligamento, que o impede de se matricular na Unesp durante cinco anos. No ano passado, foram desligados 27 alunos autodeclarados pretos ou pardos em razão de inconsistência nas informações prestadas.
“Fizemos com que todos os alunos autodeclarados pretos e pardos ingressantes na universidade passassem pela comissão sem que houvesse nenhuma violação de direitos. Houve todo um rito bem estabelecido, houve a possibilidade do contraditório, o direito de defesa. Levou tempo, mas nos ajudou a ter segurança. Foi extremamente positivo”, afirma o presidente da Comissão Central de Averiguação.
Negros nos cursos mais concorridos
Juarez Xavier, que também é militante do movimento negro, destaca que a política de ações afirmativas vigente na Unesp garante alunos pretos ou pardos em todos os 24 câmpus da Universidade. Nos cursos mais concorridos, diz ele, é onde o resultado da política se mostra mais efetivo. “Podemos afirmar que a política foi importante para o ingresso desses alunos nos cursos mais concorridos e de maior prestígio. Por exemplo, tivemos assegurado o ingresso de jovens pretos e pardos no curso de medicina, que é um dos mais concorridos do mundo.”
No Vestibular da Unesp, a carreira de medicina vem registrando, nos últimos anos, mais de 300 candidatos por vaga. Com tamanha concorrência, todos os ingressantes, inclusive aqueles provenientes das ações afirmativas, atingem pontuações com as quais ingressariam em qualquer outro curso ou carreira na Universidade.
“Isso mostra que você tem uma seleção que mantém como critério fundamental o ingresso dos melhores alunos”, diz Juarez Xavier. “O objetivo central que essas políticas têm não é tirar vaga de ninguém. O objetivo central é assegurar o ingresso de pessoas em condições de vulnerabilidade social porque se compreende, ao adotar essas políticas, que a questão fundamental é a luta contra a desigualdade. Quer dizer, faz parte dos projetos de inclusão que você reduza os índices absurdos de desigualdade no Brasil”, afirma o professor.
Racismo
Docente da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação do câmpus de Bauru e assessor da Pró-Reitoria de Extensão Universitária e Cultura da Unesp, Juarez Xavier foi vítima de racismo no último 20 de novembro, Dia Nacional da Consciência Negra.
Na ocasião, o professor foi alvo de xingamentos racistas quando estava em um local público da cidade de Bauru e se indignou diante do criminoso, que ainda o atacou com golpes de canivete, fazendo-o sangrar no braço e nas costas.
No vídeo abaixo, gravado para a TV Unesp, Xavier conta um pouco de sua trajetória pessoal de superação, de suas atividades na Universidade e do recente episódio de racismo, que repercutiu nacionalmente. Na Unesp, o docente também é coordenador do programa Educando para a Diversidade, que integra o convênio Unesp-Santander.