Segundo especialista na área, radares não garantem redução de acidentes

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  • Publicado em 2 de junho de 2017 às 17:58
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 18:12
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Ele defende que fiscalização só reduz a velocidade do motorista comportado, que não quer ser multado

Estima-se que até 2020, os acidentes de trânsito passarão da 9ª para a 3ª posição no ranking mundial de carga global de doença, medida em anos de vida ajustados por incapacidade. Anualmente, estima-se que 50 milhões de pessoas sofram lesões relacionadas a acidentes de transporte terrestre, resultando em cerca de 1,3 milhão de mortes; 62% estão concentrados em 10 países. O Brasil ocupa a 5ª posição no ranking mundial, precedido pela China, Índia, Rússia e Estados Unidos. No Brasil, a taxa de mortalidade no trânsito variou de 18-22,5 mortes/100 mil habitantes, de 2000 a 2010. Anualmente, o número de mortes e feridos graves ultrapassa 150 mil vítimas e o total de despesas relacionadas a acidentes gira em torno de 15 bilhões de dólares 2,3.

E Franca faz parte desta estatística. Só este ano, foram mais de 290 acidentes com vítimas, segundo as estatísticas da SSP (Secretaria de Segurança Pública). A maioria das ocorrências em razão de falha humana e o excesso de velocidade está entre os principais fatores de risco no trânsito, de acordo com o Movimento Paulista de Segurança no Trânsito.

A OMS (Organização Mundial da Saúde) estima que um aumento de 5% na velocidade média amplia em cerca de 10% os acidentes envolvendo lesões e de 20% a 30% as colisões fatais. Segundo a organização, o risco de um pedestre adulto morrer se atingido por um carro a menos de 50 km/h é de 20%. Porém, a chance de letalidade sobe para 60% se a pessoa for atropelada a 80 Km/h.

A velocidade excessiva também interfere no tempo de parada do veículo, o que pode ser decisivo para se envolver ou não em um acidente. Quanto maior for a velocidade, maior será a distância percorrida pelo veículo até que o motorista tenha uma reação ao se deparar com um incidente na via, como a freada repentina de um veículo à frente, uma colisão entre outros carros, a passagem repentina de um pedestre ou mesmo a de um animal.

Em razão disso, o atual prefeito Gilson de Souza, que até então era totalmente contrário a essa alternativa (leia o que foi publicado pelo Jornal da Franca em 01/06/2017 – Confira a matéria completa), anunciou que Franca receberá a implantação de 11 equipamentos para “disciplinar” o trânsito: nove radares fixos e duas lombadas eletrônicas. A justificativa dele é que os radares ajudarão na redução de acidentes.

No entanto, para o professor de Segurança de Trânsito e Engenharia de Tráfego da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Pedro Akishino, não há garantias de que os radares ajudem a reduzir o número de acidentes. “Nunca houve estatística que demonstrasse que reduzindo a velocidade se reduz o número de acidentes: a velocidade tem a ver com a gravidade do acidente, não com o acidente em si”, disse. “O número de acidentes sem vítimas é muito maior do que o de acidentes com vítima. Isso mostra que o maior número de acidentes ocorre com baixas velocidades.”

Akishino questiona também os radares como meio eficaz de reduzir a velocidade. “Radar só reduz a velocidade do motorista comportado, que não quer ser multado”, afirma. “A lombada eletrônica, por exemplo, pode ser até mais perigosa, o pedestre acha que está protegido e vem um veículo em alta velocidade. A lombada física é mais eficiente, o motorista é realmente obrigado a parar”, compara.

ESTUDO REFORÇA

Para corroborar o que diz o professor, um estudo foi realizado pelo Observatório de Saúde Urbana de Belo Horizonte (OSUBH-VIDA NO TRÂNSITO). Ele verificou que um dos problemas associados à aplicação dos detectores eletrônicos de velocidade é a tendência de alguns motoristas em frear ao passar por radar e, em seguida, exceder o limite de velocidade quando estiver fora do alcance do mesmo. Embora estudos demonstrem que o controle de velocidade por meio de radares seja eficaz na redução de acidentes de até 200m, o trabalho evidenciou que, a 200m, a adesão dos condutores aos limites de velocidade estabelecidos foi de apenas 60%. O estudo observou, assim, o chamado efeito canguru, descrito como a desaceleração e aceleração abrupta antes e após os locais dos radares. Esse achado sugere que novas estratégias são necessárias para mitigar esse contraefeito associado a mudanças na cultura da prática de excesso de velocidade, para que se tenha um efeito positivo no comportamento dos motoristas em relação aos radares. Um método relativamente novo que tem o potencial para coibir o efeito citado é o controle de percurso de via ou de verificação de velocidade média. Ao contrário dos sistemas convencionais de velocidade automáticos que medem a velocidade de um veículo em um ponto, sistemas de controle de percurso medem as velocidades médias em mais de uma distância de pelo menos 500m a vários quilômetros 25. Fiscalização rigorosa e mais imprevisível, incluindo o uso de radares móveis, também são ações sugeridas pela literatura.

DO OUTRO LADO, A POPULAÇÃO

Desde que o anúncio da instalação dos 11 radares foi feito, a população francana reagiu – a sua maioria favorável à implantação de campanhas realmente eficazes de educação no trânsito, mas contrária à geração de uma “indústria de multas”, visto que a cidade já teve equipamentos de fiscalização e pouco contribuíram para a redução de acidentes na área urbana. A questão é que o motorista francano precisa aprender a respeitar a sinalização e os limites de velocidade, o que radar nenhum seria capaz de fazer, haja vista o que o próprio especialista na área disse acima: “Radar só reduz a velocidade do motorista comportado, que não quer ser multado”.


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