Neurocientista brasileiro estuda relação entre obesidade e depressão

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 31 de dezembro de 2018 às 17:48
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 19:17
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Especialista disputado entre universidades estrangeiras estuda a comunicação entre o cérebro e o corpo

Paulistano
de nascimento mas brasiliense de coração, Ivan de Araújo já estudou filosofia,
matemática, ciência da computação e inteligência artificial. Hoje,
neurocientista disputado entre universidades estrangeiras, estuda a comunicação
entre cérebro e corpo, ou, a grosso modo, como nós mamíferos funcionamos. 

Suas pesquisas já
apareceram nas principais revistas científicas. Uma delas mostrou, por exemplo,
que a estimulação do estômago dá é prazer direto no cérebro, além da pura e simples
saciedade. Agora ele se envereda pela relação entre obesidade e depressão e
quer melhorar o tratamento da doença mental. 

O trabalho é tocado em
uma nova casa desde agosto: o laboratório no departamento de Neurociência da
Icahn Escola de Medicina da rede hospitalar Mount Sinai, em Nova York. Antes,
Araújo ficou durante 11 anos no departamento de Psiquiatria na Universidade
Yale. 

O brasileiro chegou aos EUA em 2004,
quando foi fazer um pós-doutorado na Universidade Duke, na Carolina do Norte.
Foi lá que ouviu falar de camundongos geneticamente modificados que não sentiam
determinados gostos. “Quis testar se, mesmo assim, os animais iriam gostar
de açúcar. No começo, ignoravam o ingrediente completamente, mas, ao longo do
tempo, começaram a buscar cada vez mais o açúcar”, diz.

Em um certo ponto, os bichos
consumiam tanto açúcar quanto um animal que sentia o sabor adocicado. Mas a fissura
não tem a ver com sabor, já que testes com adoçante não surtiram o mesmo
efeito.  Era a caloria que motivava a escolha pelo alimento açucarado.

Ao observar a atividade de neurônios
de recompensa no cérebro desses animais, Araújo percebeu que eles liberavam
dopamina na mesma quantidade dos animais normais. “Esse neurotransmissor é
fundamental para qualquer comportamento motivado: corrida, abuso de drogas,
comida, sexo. Quando você elimina essas células, o animal fica completamente
indiferente a praticamente tudo. Eles morrem de inanição.”

Outra pesquisa mostra que, se você
der um sabor novo para o animal e, ao mesmo tempo, injetar comida diretamente
no estômago, o bicho vai começar a gostar daquele sabor mais do que dos outros.
De alguma forma, diz, o cérebro aprendeu a associar o sabor ao estímulo que vem
do sistema gastrointestinal. Assim, talvez seja possível reprogramar o cérebro
para a escolha de alimentos menos calóricos.

A depressão também faz
parte de outra área de estudo do neurocientista que envolve obesidade. Segundo
suas pesquisas, mesmo em animais a indução de um estado obeso provoca
comportamentos depressivos, afirma.

Já que a preocupação com a autoimagem
não se aplica aos animais, Araújo tenta identificar a relação entre os dois
problemas.

O pesquisador analisa ainda se os
sistemas de recompensa que são alterados na obesidade e no abuso de drogas são
responsáveis pela depressão.  “Há algum tipo de alteração
sistêmica no corpo que conecta o estado metabólico com o funcionamento cerebral
das áreas que protegem o estado emocional.”

Araújo se dedica também a entender
como a diferença entre a distribuição dos nervos no Sistema Nervoso Central
pode ser explorada para melhorar a eficácia do tratamento da depressão,
identificada pela OMS (Organização Mundial da Saúde) como um dos principais
males da atualidade. “A gente estuda como esses
nervos penetram no cérebro, qual o caminho que eles fazem, e quais são as
partes periféricas do nervo que são relevantes para estimular essas áreas
centrais e emocionais”, afirma.

Ao identificar quais mecanismos
permitem que o estímulo do nervo vago modifique o estado emocional da pessoa,
seria possível melhorar a resposta de pacientes à terapia, diz. “E isso tem uma relevância grande porque, na depressão, os pacientes que não respondem a medicamentos são submetidos a esse tipo de estímulo”, explica.


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