Lei da Liberdade Econômica pode liberar 4,5 milhões de trabalhadores do ponto

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  • Publicado em 25 de novembro de 2019 às 23:33
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 20:04
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Para especialistas, porém, empresas que já tinham controle devem continuar com acompanhamento

O restaurante de Angelita Gonzaga, 53, em São Paulo tinha 15 empregados quando a MP (medida provisória) da Liberdade Econômica foi sancionada.

Com as novas leis, seus funcionários entraram para o grupo de 4,5 milhões de trabalhadores brasileiros que podem deixar de bater o ponto eletrônico ou de ter o horário controlado pelas empresas.

Isso porque a medida provisória passou a exigir o controle de horas só em casos de empresas cujo corpo de funcionários supere 20 pessoas. Antes da lei, a exigência era que o acompanhamento fosse feito em companhias com mais de 10 empregados. 

Com isso, 10% do estoque de 46 milhões de empregados formais no Brasil se viram livre da marcação de entrada e saída, segundo dados da Rais (Relação Anual de Informações Sociais) de 2018 sobre o total de empregos formais em empresas com 10 a 19 trabalhadores.

“Tem suas vantagens, porque é uma burocracia e um custo menor, mas sempre se recomenda a pessoa a ter algum tipo de controle”, disse Percival Maricato, presidente da Abrasel (associação de bares e restaurantes) de São Paulo.

“Não quer dizer que a empresa não possa fazer o acompanhamento, ela só é dispensada por lei da obrigação de qualquer tipo de controle”, afirma Ricardo Calcini, advogado e professor de direito do trabalho.

No caso do Arimbá, restaurante de Angelita, foi exatamente isso que ocorreu: apesar do fim da exigência, ela manteve a marcação dos horários de entrada e saída de seus funcionários. 

“Prefiro continuar com algum controle. Até tudo ficar ajustado é melhor, pois as leis mudam a todo momento, e quem sempre paga o preço é o empresário”, disse a proprietária do restaurante.

Ela afirma ainda que, embora considere o ponto eletrônico mais seguro, o custo do aparelho não não compensa já que agora não há mais essa exigência legal.

“Tínhamos o ponto de biometria, mas era um custo mensal de R$ 250 de manutenção do relógio. Por conta da crise, nós começamos a aparar arestas e cortar gastos, e eu adotei o livro de ponto.”

Para advogados trabalhistas, o caminho seguido no Arimbá deveria ser o de todos os empreendimentos que se enquadram nesta situação. 

Na avaliação da advogada Mayra Palópoli, do escritório Palópoli & Albrecht, a empresa tem que ter algum tipo de controle, ainda que informal, para que, quando o empregado tiver trabalhado em horário extraordinário, ele seja remunerado corretamente. 

“A hora extra precisa ser paga independente de quantos funcionários se tenha na empresa”, afirmou.

Ela alerta, no entanto, que nessas empresas que têm entre 11 e 20 funcionários, e que passam por essa transição, inverte-se a lógica do ônus da prova em um possível processo trabalhista.

“Se ocorrer uma disputa judicial, e a empresa tiver menos de 20 trabalhadores, ela não precisa apresentar documento nenhum, porque a lei não exige que ela tenha esses documentos. Então é o empregado que vai ter que comprovar, seja por testemunha, por email ou chamada de telefone.”

Pela mudança de interpretação, o advogado Ricardo Calcini avança na precaução para essas empresas, ao dizer que retirar o controle de horas em contratos de trabalho já vigentes pode até ser considerado ilegal.

“Fazer alterações nesses casos não é recomendável, porque pode-se entender que esse registro [de trabalho] foi acertado com condições mais benéficas para o trabalhador, porque era a empresa que precisava comprovar o horário de trabalho extraordinário. Quando ela fica isenta disso, e a lógica muda, é o trabalhador que assume essa responsabilidade.”

A medida, que foi criada como mais um dispositivo para desburocratizar o país, vai acabar sendo ruim tanto para a empresa quanto para o trabalhador, segundo Ricardo Patah, presidente da UGT (União Geral dos Trabalhadores).

“Empresas de até dez funcionários já vinham negociar conosco justamente pela ausência desse controle. Então isso vai gerar um passivo para elas. Já do ponto de vista do trabalhador é uma insegurança, porque ele vai ter que anotar a exceção, se ele for permitido a fazer isso.”

Por enquanto, as empresas que tinham entre 11 e 20 funcionários não estão mudando seus sistemas, de acordo com o analista de departamento pessoal Fernando de Paula, do escritório de contabilidade Resc Radial.

“Elas preferem manter porque entendem que pode aumentar o número de seus empregados, e então elas estariam já adaptadas para as regras de empresas com mais de 20 funcionários. As novas é que vão poder optar por isso”, afirmou.

Uma grande empresa do setor de aparelhos de ponto eletrônico, que não quis ter seu nome revelado, disse à Folha que até agora não sentiu nenhuma redução na demanda pelo seu produto.

Segundo a companhia, o preço dos relógios de ponto costuma variar entre R$ 1.500 e R$ 2.000. Já o software, que computa as informações registradas no aparelho, variam de preço, com um valor mínimo de R$ 5 por funcionário da empresa.

Fonte: Folha de SP


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