Jardineiro de 61 anos, que vive em casa de madeira, passa na Universidade

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 4 de fevereiro de 2020 às 14:52
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 20:20
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Homem de 61 anos estudou o ano todo e passou na Federal do Pará; vai ser enfermeiro para ajudar as pessoas

​​É contagiante a alegria do calouro Alcyr Ataíde Carneiro, de 61 anos, o jardineiro que passou em Enfermagem na UFPA, Universidade Federal do Pará.

A foto dele viralizou na nas redes sociais, com a mãe cortando os cabelos do filho para comemorar. Mas muita gente não sabe o quanto esse homem batalhou para vencer.

Alcyr mora no bairro do Coqueiro, em Belém. Ele vive com a mãe em uma casa de madeira alugada, trabalha há 23 anos cortando grama em quintais, mas já foi recenseador, fez serviços gerais e trabalhou como cobrador de ônibus.

Ele disse ao G1 que se dedicou aos estudos para tentar vaga no ensino superior para tentar melhorar a situação da família.

Alcyr diz que a aprovação na primeira tentativa é resultado de um ano de dedicação, perseverança e força de vontade:

“Só Deus sabe o que passei, mas acho que uma coisa é certa: consegui esse êxito porque tudo que fiz para alcançá-lo foi porque eu acreditei que a educação é capaz de transformar a vida das pessoas”, disse.

A virada

O jardineiro contas que se matriculou em um cursinho pré-vestibular em março do ano passado e que dividia a sala com garotos entre 16 e 18 anos.

Ele trabalha duro cortando grama de manhã, fazia aulas no período da tarde e as revisões eram em casa à noite e nas madrugadas.

Mesmo com todo esse esforço, ele nunca faltou a uma aula sequer, nunca chegou atrasado, queria participar de tudo, e todos lhe incentivavam – os colegas, os professores, a coordenação, o segurança, o pessoal que trabalhava na limpeza.

“Eu até brincava que se dependesse de torcida, eu já estava aprovado. Me senti valorizado, por isso eu sempre dediquei o máximo”, contou.

Universidade Federal do Pará, onde Alcyr Ataíde Carneiro, de 61 anos, vai estudar

Talismã

O quarto de Alcyr virou uma sala de estudos, com livros doados amontoados para todo lado.

Ele aponta um objeto que foi determinante para que não perdesse o foco: um jaleco que ganhou de um sobrinho que é médico e costumava dar roupas para Alcyr.

Uma vez o sobrinho lhe deu um jaleco, para usar no trabalho. Ele lavou lavei, colocou em um cabide e deixou no seu quarto. Tinha um pensamento que aquele jaleco seria um motivo para lhe incentivar a não desistir. 

“Até hoje, ele está lá do mesmo jeito que eu coloquei pela primeira vez, foi como um talismã”.

“Quando estava cansado, exausto e achando que não ia conseguir, olhava aquele jaleco e dizia para mim mesmo: um dia vou estar usando um jaleco como esse”, revela, emocionado.

Ajudar as pessoas

Depois que os familiares publicaram a foto da aprovação, Alcyr começou a receber muitas mensagens de carinho e felicitações.

“Muitas pessoas vieram me parabenizar, eu nem esperava tudo isso, mas foi uma felicidade tão grande, me senti tão honrado, que eu vou ser sincero, até hoje ainda me deixa cheio de emoção”.

Alcyr disse que iria fazer a matrícula na universidade e disse o motivo de ter escolhido Enfermagem.

“Já fiz cinco cirurgias, em vários hospitais, sempre fui muito bem atendido por enfermeiros, médicos, aí passei a ter uma simpatia pela área da saúde.

“Pretendo ser competente e digno para ter uma vida melhor para mim e minha família, além de dar minha contribuição para a sociedade, ajudar as pessoas, sem discriminação, pessoas de baixa renda. Foi por tudo isso que optei pelo curso”, concluiu.


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