Tecnologia é usada em exames mais precisos contra câncer em Barretos

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 15 de fevereiro de 2018 às 12:07
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 18:34
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Com uso da inteligência artificial, aumenta a precisão sobre agressividade de tumores como da tireoide

Uma parceria entre uma startup
de Ribeirão Preto e o Hospital do Câncer de Barretos promete ampliar a precisão
dos diagnósticos e evitar que pacientes com neoplasias sejam submetidos a
tratamentos agressivos como radioterapia e cirurgias sem a real necessidade.

Os primeiros projetos desenvolvidos pela Onkos, ainda em
fase de testes e validação com uso de amostras de pacientes do centro médico em
Barretos, são voltados a tumores na tireoide e na próstata.

Com uso de inteligência artificial, os exames consistem
em sistemas de computador que aprendem à medida que recebem novas informações e
criam escalas de risco baseadas no material genético das células – os microRNAs
– que sofreram as mutações.

Além de melhorar a qualidade de vida das pessoas,
diagnósticos mais precisos podem futuramente gerar economia de recursos gastos
com cirurgias e tratamentos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), segundo o CEO da
startup, Marcos Santos, biólogo e doutor em oncogenética e biologia molecular.

Hoje há métodos similares disponíveis em países como
Estados Unidos e Japão, mas de alto custo e inacessíveis para a maior parte dos
pacientes, segundo ele.

Segundo o Instituto Nacional
de Câncer (Inca), o câncer da tireoide – glândula localizada no pescoço
responsável pela produção de hormônios e pela regulação de diferentes órgãos do
corpo – é responsável por até 5% dos tumores malignos em mulheres brasileiras,
com média de 5,7 casos para cada cem mil habitantes, e em menos de 2% dos casos
no público masculino, com um caso para cem mil habitantes.

Com o método convencional aplicado, que avalia por
microscópio as células extraídas por punção do pescoço do paciente, até 80% dos
pacientes identificados com tumores indeterminados – que podem ser benignos ou
malignos – são levados à cirurgia de extração da glândula sem que realmente
precisassem, segundo o presidente da Onkos.

Isso representa, de acordo com estimativas da própria
startup, 40 mil procedimentos desnecessários por ano. “O grande problema é que depois que você tira
a glândula de tireoide, o médico que faz a cirurgia tem a glândula toda na mão,
aí fica muito fácil ver se aquilo é benigno ou maligno”, diz o CEO.

No novo método desenvolvido,
um algoritmo – uma espécie de programa de computador que vai acumulando
informações e “aprendendo” aos poucos a reagir de acordo com
diferentes situações – consegue interpretar determinadas informações fornecidas
pelo material genético do tumor em questão, de modo que seja possível
estabelecer uma escala de risco. O material analisado pelo sistema é o mesmo
obtido pelo sistema convencional.

Diante de um tumor benigno, é possível evitar, por
exemplo, a retirada da tireoide e suas implicações, como riscos de lesão nas
cordas vocais e a necessidade de reposição hormonal permanente. A precisão do
teste para esse tipo de resultado é de 95%, segundo o cirurgião de cabeça e
pescoço do Hospital de Câncer de Barretos, Ricardo Gama. “Se o paciente
tem uma tireoide que funciona e você remove toda a tireoide, ele passa a ficar
dependente de hormônio da tireoide pro resto da vida. Ele tem que tomar o
hormônio tireoidiano, que é comprimido, pro resto da vida, para repor aquele
hormônio que não é produzido mais pela ausência da glândula”, explica.

Segundo ele, a chance de uma
extração na tireoide deixar sequelas na voz é de 3%, mas somente quando os
pacientes são atendidos por profissionais habilitados. “É baixa, mas a gente tem que imaginar
que não é todo local do país que tem cirurgião de cabeça e pescoço disponível.
A gente tem muitos outros profissionais às vezes não tão habilitados realizando
essa cirurgia, cuja incidência de problemas relacionados com a cirurgia, com
problemas vocais, pode ser maior.”

O projeto, o primeiro desde a
criação da startup, em 2015, foi desenvolvido com uso de dados moleculares de
170 pacientes do Hospital de Câncer de Barretos, e está em fase de validação.

A expectativa é de que o exame primeiro chegue ao
mercado ao custo de R$ 4 mil – até quatro vezes abaixo dos similares – em março
deste ano. A disponibilidade por meio de convênios e pelo SUS, no entanto,
ainda depende de trâmites próprios. “A
gente vem trabalhando pra fazer a documentação pra solicitar a entrada do nosso
exame no rol da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) e depois a gente
quer tentar a submissão pra que seja coberto pelo SUS”, afirma Santos.

Partindo do mesmo fundamento
científico, a parceria entre o hospital em Barretos e a startup de Ribeirão
também trabalha em um teste para detectar a real agressividade do câncer de
próstata, o segundo mais recorrente entre os homens no Brasil – somente atrás
do de pele -, com uma média de 61,82 novos casos para cada cem mil habitantes,
segundo o Inca.

Ainda em fase de elaboração, o algoritmo promete
identificar células saudáveis, recidivas – com risco de a doença voltar para
quem já teve câncer – ou com alto risco de metástase.

Serão colocados em testes dados moleculares de 240
pacientes do hospital nas fases de desenvolvimento e validação, explica o
médico oncologista Flávio Cárcano.

O diagnóstico hoje utilizado também estabelece uma
escala de risco, mas é baseado em dados clínicos, de acordo com a extensão do
tumor avaliado no exame de toque, o exame do PSA – que avalia a presença do
Antígeno Prostático Específico e ainda de acordo com o grau tumoral.

No novo método, a expectativa
é de que dados genéticos deem respostas mais exatas entre os pacientes baixo,
médio ou alto risco de desenvolver o câncer. “O que o teste quer trazer é
uma ferramenta que possa ser mais acurada em estratificar esse risco, porque
mesmo com essa estratificação de risco atual, existem pacientes que, de
repente, são de alto risco em um grupo intermediário ou aqueles que são
intermediários, mas são de baixo risco”, afirma Cárcano.


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