Escolha da bebida está relacionada ao prazer e não ao sabor, diz pesquisa

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 4 de maio de 2019 às 19:37
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 19:32
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Bebidas populares passaram a ser alvo de estudos científicos por estarem relacionadas às doenças crônicas

Gostar mais de café do que de refrigerante é uma questão que vai
além do sabor. A preferência também está relacionada ao DNA humano e às
compensações desencadeadas por ela, segundo cientistas americanos.

Um grupo de pesquisadores chegou a essa conclusão após analisar o
comportamento alimentar de mais de 300 mil pessoas. Descobriram que a escolha
por bebidas doces ou amargas é desencadeada pela recompensa mental causada
muito mais pela ingestão do alimento favorito do que pelo gosto dele. As
descobertas foram publicadas na última edição da revista científica Human
Molecular Genetics.

Os autores do estudo explicam que bebidas populares, como café,
cerveja e refrigerantes, têm sido associadas a doenças crônicas e, por isso,
passaram a ser alvo de estudos científicos diversos.

Muitos cientistas acreditam que a preferência por determinados
alimentos está relacionada à genética de um indivíduo, mas nenhum estudo
conseguiu explorar esse tema profundamente. “Investigações anteriores sugerem
que o sabor é hereditário, e que a percepção do paladar e as preferências são
determinantes no consumo de bebidas. No entanto, nenhum estudo abordou essas
associações até o momento”, conta ao Correio Victor Wenze Zhong, um dos autores
do estudo e pesquisador da Universidade de Nortwestern, nos Estados Unidos.

Na tentativa de aprofundar o entendimento sobre esse comportamento
alimentar, Zhong e colegas conduziram um experimento em que, inicialmente,
categorizaram uma série de bebidas como de sabor amargo ou doce. Entraram no
primeiro grupo café, chá, sumo de toranja, cerveja, vinho tinto e licor. No
segundo, bebidas adoçadas com açúcar, adoçadas artificialmente e sucos de fruta
não adoçados.
A ingestão desses alimentos foi registrada por meio de questionários
respondidos diariamente durante algumas semanas. Também havia nos registros
itens ligados a fatores comportamentais. Os cientistas contabilizaram o número
de porções das bebidas ingeridas por cerca de 336 mil pessoas. Em seguida,
fizeram um estudo de associação genômica considerando a ingestão dos dois tipos
de bebida.

Para surpresa dos autores, as análises mostraram que preferências
por bebidas amargas ou doces não são baseadas em variações dos genes
gustativos, relacionados ao paladar. Estão associadas a genes ligados a propriedades
psicoativas desses alimentos. “As pessoas gostam de como o café e o álcool as
fazem se sentir. É por isso que elas bebem. Não é o gosto das bebidas que leva
às predileções”, explica Zhong.

Mistérios

Os pesquisadores também ressaltam que os dados obtidos mostram
mecanismos do sistema de recompensa cerebral, um sistema essencial para se
entender o comportamento alimentar humano. “O estudo destaca importantes
componentes do esquema comportamento/recompensa para a escolha de bebidas.
Dessa forma, é possível entender as barreiras potenciais que intervêm nas
dietas das pessoas”, frisa o autor do estudo.

Zhong também chama a atenção para os impactos das preferências
alimentares na saúde dos indivíduos. “As bebidas açucaradas estão ligadas a
muitas doenças. O consumo de álcool, por exemplo, está relacionado a mais de
200 enfermidades e é responsável por cerca de 6% das mortes no mundo”, ilustra.
Os autores também identificaram uma variante no gene FTO ligada à predição por
bebidas açucaradas. “As pessoas que tinham essa variante — a mesma
anteriormente relacionada ao menor risco de obesidade — surpreendentemente
preferiam bebidas açucaradas”, conta Zhong. “É contraintuitivo: o FTO tem sido
um gene misterioso, e não sabemos exatamente como ele está ligado à obesidade.”

Um dos próximos passos do estudo será identificar mais genes
relacionados a preferência por bebidas doces ou amargas. “Descobrimos esse
diferencial do gene FTO, mas essa associação inversa requer mais verificação.
Também precisamos elucidar mecanismos que vão além das variantes genéticas”,
adianta o autor do estudo
.


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