Levantamento nacional mostra que o volume no primeiro semestre de 2024 já supera 24 mil processos novos na Justiça do estado
De acordo com dados inéditos extraídos do DataJud, o painel de estatísticas do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), o número de processos na Justiça relacionados ao empréstimo consignado registrou um salto de 22,19% entre 2022 e 2023 no Brasil.
A variação registrada foi de 478.754 para 585.001 casos em todo o país. E em média, no 1º semestre de 2024, foram registrados 1.768 novos processos todos os dias entre os clientes e as instituições financeiras.
Nesse período, o mais recente disponível, o montante acumulado chega a 320.061 casos novos e a tendência é de 2024 superar o ano anterior.
O estado de São Paulo registrou, no 1º semestre de 2024, uma média de 134 reclamações na Justiça por dia e um volume acumulado de 24.271 ações. Entre 2022 e 2023, a alta foi de 52,21%. Com exceção de nove estados, a maior parte do Brasil registrou alta.
Direito do Consumidor
Os maiores aumentos percentuais foram no Espírito Santo (94,62%), Bahia (57,12%) e São Paulo (52,21%). O Maranhão foi o estado com o maior número de casos em 2023, com 113.587 processos novos, uma média de 311 por dia. O estado do Piauí ocupa o segundo lugar, com 87.783 e 241 processos diários em média.
O empréstimo consignado ocupa o quarto tema entre os maiores assuntos em Direito do Consumidor em 2022 e 2023, atrás de inclusão indevida em cadastro de inadimplentes, indenização por dano material e indenização por dano moral.
Os principais problemas relacionados a empréstimos consignados que costumam ser discutidos na Justiça consistem nas fraudes, cobranças abusivas e na margem consignável, o valor máximo que pode ser descontado de cada salário.
Especialistas apontam que o volume de ações na Justiça é alarmante e que uma parcela da população costuma ser mais vítima de possíveis injustiças relacionadas aos empréstimos.
Combinação de fatores
“Os idosos são extremamente vulneráveis. Muitas vezes, eles são alvos de abordagens agressivas e enganosas, aproveitando-se de sua eventual falta de conhecimento sobre os termos do contrato ou de suas limitações que impedem a total compreensão dos riscos e condições estabelecidas para a contratação de um empréstimo”, relata Larissa Rezende, advogada especialista em Direito Bancário do VLV Advogados.
A advogada lembra que as empresas que desrespeitam a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) e obtêm dados de contato para oferecer os empréstimos podem ser punidas pela ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados) com uma multa de 2% do faturamento da empresa.
Já de acordo com Brisa Nogueira, advogada especialista em Direito do Consumidor e sócia do Brossa e Nogueira Advogadas, o aumento no número de processos reflete uma combinação de fatores, incluindo o aumento da vulnerabilidade econômica de certos grupos e práticas abusivas por parte de instituições financeiras.
Benefícios contínuos
A especialista aponta que os principais afetados são aposentados, pensionistas e beneficiários de programas sociais, que muitas vezes não têm pleno conhecimento dos termos contratuais.
“O empréstimo consignado é oferecido, em grande parte, para pessoas que recebem benefícios contínuos, como aposentadorias e pensões. Essas pessoas, muitas vezes, são alvo de assédio por parte dos bancos, que utilizam SMS, ligações e outras formas de comunicação para persuadi-las a contratar esses empréstimos,” explica.
A advogada destaca que, embora o crédito consignado possa ser uma ferramenta útil para aqueles que precisam de dinheiro rápido, a falta de transparência nos contratos e o desconhecimento sobre os juros podem levar a uma dívida muito maior do que o valor originalmente emprestado.
Detalhes contratuais
“Muitos clientes chegam ao escritório depois de anos pagando parcelas, sem entender por que a dívida não diminui. Em alguns casos, conseguimos levar a questão ao Judiciário para tentar reduzir o número de parcelas ou o percentual de juros, mas isso é difícil, pois muitas vezes o Poder Judiciário entende que a contratação foi de livre e espontânea vontade.”
Brisa conclui que, apesar de algumas vitórias nos tribunais, a situação ainda é preocupante, e muitos consumidores permanecem presos em contratos desvantajosos.
Ela reforça a necessidade de uma maior conscientização e de políticas que protejam os consumidores mais vulneráveis de práticas abusivas.