Efeito sanfona: o que a memória celular tem a ver com o reganho de peso

  • Joao Batista Freitas
  • Publicado em 2 de dezembro de 2024 às 18:00
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Alessandra Rascovski, endocrinologista e diretora da clínica Atma Soma, explica a relação entre o reganho de peso e o mecanismo celular

Um dos grandes receios de quem segue uma trajetória de emagrecimento é voltar a ganhar peso ao longo do caminho, vivenciando o chamado “efeito sanfona”.

A expressão está ligada a pessoas que emagreceram com dietas restritivas e voltam a ganhar peso assim que abrem mão do regime – algo frustrante que acontece em mais de 80% dos casos.

O que causa esse problema? Adoção de dietas restritivas? Sedentarismo? Compulsão alimentar? Ansiedade? Ainda não há um consenso sobre os fatores que ocasionam o retorno dos quilos indesejados. No entanto, por ser um fenômeno frequente, muitos cientistas buscam entender as verdadeiras causas desse tipo de condição.

Novas abordagens em pesquisas estão trazendo um novo olhar para o assunto, ligando o efeito sanfona à epigenética.

Um estudo inédito, desenvolvido por um grupo de cientistas do Instituto Federal de Tecnologia de Zurique, na Suíça, publicado recentemente na revista Nature, revelou que o retorno do peso em pessoas com histórico de obesidade está relacionado a mudanças no DNA de células de gordura.

Palavra da endocrinologista

De acordo com Alessandra Rascovski, endocrinologista e diretora médica da clínica Atma Soma, a obesidade ocasiona mudanças epigenéticas no núcleo das células de gordura e a “memória” do sobrepeso permanece.

Com isso, o retorno desse estado pode ocorrer com facilidade, devido à resistência dessas células às tentativas de perder peso. “Quando há um consumo significativo de calorias, as células de ex-obesos crescem de forma mais rápida do que o tecido adiposo de pessoas que nunca tiveram obesidade”.

Segundo a especialista, as células de gordura têm uma vida longa, de cerca de dez anos, antes de serem substituídas por outras. Ela reforça que essas informações não podem ser “apagadas” com o uso de medicamentos.

O papel da epigenética

Vale destacar que a epigenética é uma área da biologia que estuda as alterações na expressão dos genes que não envolvem mudanças na sequência do DNA. Esses efeitos podem ser ocasionados por fatores externos, como dieta, estresse, estilo de vida e poluição.

“As pesquisas em epigenéticas podem ajudar na compreensão de como aspectos ambientais e comportamentais contribuem para uma série de doenças, incluindo não somente a obesidade, mas também câncer, diabetes, problemas psiquiátricos, entre tantos outros”, avalia a endocrinologista.

Para confirmar os achados, o estudo foi feito em camundongos, avaliando o comportamento das células de gordura em animais com sobrepeso e naqueles que emagreceram por meio de dieta. Os cientistas observaram que os animais com marcadores epigenéticos recuperaram o peso mais rapidamente ao retomar uma dieta rica em gordura.

Evidências semelhantes foram encontradas em humanos, com base em biópsias de tecido adiposo de pacientes que realizaram cirurgia bariátrica ou redução do estômago, analisadas antes do procedimento e dois anos depois.

Novos avanços para o futuro

Os progressos recentes no campo da epigenética têm lançado uma nova luz sobre o efeito sanfona, desafiando muitas das noções tradicionais sobre o reganho de peso.

Novas pesquisas, indicando que a memória celular e as alterações epigenéticas desempenham um papel importante nesse fenômeno, oferecem novas vias para intervenções mais eficazes.

Além disso, terapias epigenéticas, como inibidores de enzimas específicas ou moduladores de RNA, já estão em desenvolvimento e podem oferecer uma nova era de tratamentos que atuam diretamente na raiz do problema, promovendo mudanças metabólicas mais estáveis e sustentáveis.

Alessandra acredita que esses avanços abrirão mais possibilidades para pacientes que lutam contra o efeito sanfona. “Estamos no início de uma jornada emocionante e creio que haverá muitas novidades no futuro para ajudar os pacientes a enfrentar esse desafio com mais eficácia,” conclui.


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