Cientistas criam curativo que pulsa para tratar corações infartados

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 28 de maio de 2018 às 01:21
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 18:45
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Pesquisadores parecem ter encontrado uma forma de reverter condição do coração e salvar vidas

Os médicos costumam dizer que
quando alguém sofre um ataque cardíaco, “o tempo é músculo”.

O coração depende de um fornecimento contínuo de
oxigênio proveniente das artérias coronárias. Se elas entopem e o abastecimento
para as células musculares do órgão começam a morrer em questão de minutos.

Em muitos casos, a menos que os cirurgiões consigam
aliviar a obstrução dentro de uma hora, mais de 1 bilhão de células musculares
são irreversivelmente perdidas.

Os pacientes que sobrevivem costumam desenvolver um
quadro de insuficiência cardíaca permanente. E, cinco anos após o ataque, 50%
deles não estarão mais vivos. No Brasil, cerca de 50 mil pacientes morrem
anualmente em decorrência de insuficiência cardíaca, de acordo com a Sociedade
Brasileira de Cardiologia.

Nos próximos cinco anos, no
entanto, a medicina regenerativa poderá oferecer uma nova alternativa radical:
curativos para o coração, preparados em laboratório.

Diferentemente de alguns órgãos, como a pele e o fígado,
o coração tem uma capacidade muito limitada de regeneração. As células
musculares cardíacas se replicam a uma taxa de apenas 0,5% ao ano, o que não é
suficiente para reparar qualquer dano significativo.

As células mortas acabam sendo substituídas por camadas
espessas de tecido cicatrizado rígido e resistente, o que significa que essas
partes do coração simplesmente deixam de funcionar.

Atualmente, o transplante é a única opção para pacientes com
insuficiência cardíaca. Mas, na ausência de doadores em número suficiente,
menos de 400 procedimentos do tipo são realizados por ano no Brasil.

As células-tronco podem oferecer uma alternativa. Em ensaios clínicos,
cientistas tentaram “recuperar a musculatura” de corações lesados
injetando células-tronco individuais – do sangue ou da medula óssea do próprio
paciente – diretamente no coração.

Embora essa abordagem tenha regenerado com sucesso os vasos sanguíneos
comprometidos e melhorado, assim, o fluxo de sangue para o coração, apresentou
um benefício mínimo em termos de resolver o problema principal: fazer crescer
novamente o músculo cardíaco perdido. Isso porque 95% das células-tronco
injetadas não são incorporadas ao órgão e desaparecem imediatamente na corrente
sanguínea.

Curativos

Mas, em parceria com uma equipe de biólogos do Instituto de
Células-Tronco da Universidade de Cambridge, Sanjay Sinha, cardiologista do
Hospital Addenbrooke, em Cambridge, está desenvolvendo uma solução ligeiramente
diferente: curativos para “remendar” o coração. São retalhos
minúsculos de músculo cardíaco que pulsam – cada um com menos de 2,5
centímetros quadrados de área e meio centímetro de espessura – criados em
pequenas placas no laboratório.

Cultivados ao longo de um mês, os curativos são feitos a partir de
amostras de células do sangue, que são reprogramadas para a função de um
determinado tipo de célula-tronco (capaz de se transformar em qualquer célula
no corpo humano) – no caso, em células do músculo cardíaco, dos vasos
sanguíneos e do epicárdio, membrana que envolve e dá forma ao coração.

Esses aglomerados de células cardíacas são então cultivados em um
suporte especial, sendo organizados e alinhados em uma estrutura semelhante à
do tecido cardíaco verdadeiro.

Atualmente, o transplante é a
única opção para pacientes com insuficiência cardíaca. Mas, na ausência de
doadores em número suficiente, menos de 400 procedimentos do tipo são
realizados por ano no Brasil.

As células-tronco podem oferecer uma alternativa. Em
ensaios clínicos, cientistas tentaram “recuperar a musculatura” de
corações lesados injetando células-tronco individuais – do sangue ou da medula
óssea do próprio paciente – diretamente no coração.

Embora essa abordagem tenha regenerado com sucesso os
vasos sanguíneos comprometidos e melhorado, assim, o fluxo de sangue para o
coração, apresentou um benefício mínimo em termos de resolver o problema
principal: fazer crescer novamente o músculo cardíaco perdido. Isso porque 95%
das células-tronco injetadas não são incorporadas ao órgão e desaparecem
imediatamente na corrente sanguínea.

“Sabemos que as células epicárdicas
são particularmente importantes na coordenação do desenvolvimento adequado do
músculo cardíaco. Pesquisas mostram que, nos embriões, ocorre muita
interferência entre o epicárdio e o coração que está se desenvolvendo”,
acrescenta.

Sinha se prepara atualmente
para testar os curativos em camundongos e, em seguida, em porcos. Se tudo der
certo, o cardiologista pode estar pronto para realizar as primeiras
experiências em seres humanos em cinco anos. 

Em busca da batida perfeita

E ele não está sozinho. Nos Estados Unidos, uma equipe
formada por cientistas das universidades de Stanford, Duke e Wisconsin também
está tentando desenvolver curativos cardíacos.

Assim
como Sinha, os pesquisadores imaginam um procedimento que começaria pela
identificação dos tecidos cardíacos lesados por meio de exames de
ultra-sonografia e ressonância magnética. Com base no formato das cicatrizes,
eles imprimiriam um curativo personalizado em 3D. Os cirurgiões abririam então
a caixa torácica e costurariam o “remendo” diretamente no órgão, de
maneira que fique conectado às veias e artérias existentes. “Ele muda de
forma, pode ter a aparência de uma bola de rúgbi, de basquete ou de um grande
balão.”

Um dos principais desafios é
integrar eletricamente o curativo ao coração, a fim de garantir que ambos
pulsem sincronizados. Qualquer conexão elétrica defeituosa poderia resultar em
um ritmo cardíaco anormal. “Esperamos que eles façam isso. Acreditamos que
os sinais elétricos que passam como uma onda através do músculo cardíaco,
dizendo para ele contrair, façam com que o curativo contraia na mesma proporção”,
diz Sinha.

Procedimento mais barato

Se os desafios forem superados, Sinha afirma que eles poderão
não apenas salvar vidas, mas também economizar dinheiro.

No Reino
Unido, um transplante cardíaco custa cerca de £500 mil – algo em torno de R$
2,5 milhões, incluindo os custos da internação hospitalar. Para os milhares de
pacientes com insuficiência cardíaca que não conseguem um transplante, as
despesas com cuidados médicos contínuos e repetidas internações podem ser ainda
maiores. Já o valor estimado atualmente para um “curativo cardíaco”
gira em torno de £70 mil – quase R$ 350 mil.

Além
disso, os curativos são feitos a partir do sangue do próprio paciente, o que
significa que eles não precisariam passar por algumas complicações associadas
aos transplantes – como as altas doses de drogas imunossupressoras para evitar
a rejeição do órgão.

Segundo os pesquisadores, a
tecnologia pode mudar a vida de milhões de pessoas ao redor do mundo. “A
insuficiência cardíaca pode muitas vezes incapacitar o indivíduo”, diz
Sinha. “Você está sempre exausto,
não consegue subir sequer um lance de escadas. Mas, pela primeira vez, achamos
que somos realmente capazes de recriar o tecido cardíaco vivo, que é idêntico
ao do paciente, onde as células se comunicam de maneiras misteriosas e
maravilhosas, trabalhando juntas como fazem no corpo.”, comemora. “Se
conseguirmos ajustar o procedimento nos próximos anos e garantir que seja
completamente seguro, ele poderá ajudar essas pessoas a terem uma vida normal
novamente.”


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