Captação da água do Sapucaí: o que falta ser explicado pela Sabesp e Prefeitura

  • Caio Mignone
  • Publicado em 3 de outubro de 2021 às 11:00
  • Modificado em 3 de outubro de 2021 às 16:41
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São Pedro está carregando a culpa pela falta de água nas casas francanas, já que as autoridades dizem que o problema não é delas

Estacas fincadas no leito do Rio Sapucaí, a 21 quilômetros de Franca: nenhuma gota desse rio chegou nas casas francanas

No dia 26 de março de 2010, o então governador do Estado de São Paulo, José Serra, esteve em Franca e aqui assinou o contrato do primeiro lote das obras do sistema de captação de água do Rio Sapucaí.

Entre os vários arroubos, quem estava no ato de assinatura ouviu as promessas: a nova captação iria garantir o abastecimento de Franca e Restinga por mais 30 anos. Ou então, até que as duas cidades tivessem em torno de 500 mil habitantes.

José Serra foi taxativo: “O investimento – que foi anunciado como de R$ 154 milhões – não vai ter furo, porque o grupo de empresas que vai fazer a captação de água e o tratamento vai receber (o dinheiro) só depois que a água estiver sendo fornecida, então não tem erro”.

O então governador explicou a razão do seu entusiasmo: “As empresas têm interesse em fazer uma obra boa e no menor espaço de tempo possível e isso preenche o nosso interesse que é ter água boa num espaço de tempo mais curto”.

Uma sexta-feira

Naquela sexta-feira, dia 26 de março de 2010, o entusiasmo do governo e da Sabesp era para a introdução de um novo tipo de financiamento de obra.

Na verdade, ainda que não fosse anunciado com todas as letras, estava sendo implantada uma espécie de PPP – a tão acalentada Parceria Público-Privada.

É importante observar os detalhes. “Dividido em dois lotes de contratação, o sistema de produção de água Sapucaí é o maior complexo de obras no interior e tem investimento total de R$ 154 milhões”, diz a notícia do Governo do Estado.

“Uma nova modalidade de financiamento está sendo utilizada, denominada locação de ativo. Nesse sistema, o vencedor da licitação contrata o financiamento, executa as obras e depois é ressarcido pela Sabesp no prazo de 15 anos após o início da operação”.

Muitas promessas

Resumindo todas as informações: a Sabesp abriu uma licitação para encontrar quem executasse a obra com seus próprios recursos financeiros e aceitasse receber seu investimento em 15 anos, ou seja, com a geração de receita do próprio empreendimento.

Tudo muito simples, explicado pelo próprio governador.

Como em todo processo sempre existe o risco do imponderável, a população francana sabe de forma clara que o imponderável aconteceu.

A vencedora da licitação não teve recursos, parou as obras, a Sabesp precisou discutir os termos do contrato na Justiça e a população de Franca está vivendo um racionamento de 36 horas com água de meia pressão e 36 horas de canos vazios.

Sem culpados

O prefeito Alexandre Ferreira disse que a culpa não é da Sabesp, nem da Prefeitura e nem dele. O prefeito está vendo a questão como sendo uma crise hídrica. Sua fala de agora nega sua fama de gestor.

Com uma visão quase míope, o prefeito está passando por cima de todos os fatos acontecidos desde a decisão de captar a água do Sapucaí.

A crise hídrica não é culpa do prefeito e nem da Sabesp, mas o que acontece em decorrência dela é. Bons gestores são os que antecipam o problema e, uma vez instalado o caos, implantam um gabinete de crise para minimizar seus efeitos.

Racionamento

Aqui em Franca, com a crença de que as chuvas chegariam para resolver a falta de água, nada foi feito. Nem mesmo a antecipação do racionamento e do rodízio.

Dizer que não há culpados é jogar com palavras e, mais do que isso, acreditar na crença e na boa vontade da população. Ou então colocar na testa de cada pessoa uma etiqueta chamando-a de desinformada.

Tem sido mais fácil jogar tudo nas costas de São Pedro.

Detalhes

Quando foi concebido o projeto da captação de água do Sapucaí, seriam quase 21 quilômetros de adutoras de água bruta, mais de 11 quilômetros de adutoras de água tratada, um sistema de recalque e processamento do lodo gerado pela estação de tratamento, com uma estação elevatória e 7 km de adutoras.

Não bate

O presidente da Sabesp veio a Franca e ao lado do prefeito Alexandre Ferreira e disse que o novo sistema vai garantir o abastecimento de água em Franca por mais 50 anos.

Há um desencontro de informação e uma aposta, novamente, na boa-fé dos francanos.

Se em 2010 o sistema teria vida útil de 30 anos, como é que os mesmos números e o mesmo projeto agora terão vida útil de 50 anos?

O fato é que 11 anos depois de assinado o contrato para início das obras, nem mesmo uma gota de água do Sapucaí chegou às casas dos francanos.

Tempo suficiente para evitar as consequências de uma crise hídrica. Tempo suficiente para jogar por terra todo conceito que Franca adquiriu como a cidade com o melhor saneamento básico do país.

Mas esses eram outros tempos e outros gestores.


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