Buscas no Google sobre transtorno mental registram recorde no país

  • Bernardo Teixeira
  • Publicado em 21 de setembro de 2020 às 14:00
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 21:15
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A pergunta “como lidar com a ansiedade” bateu recorde de interesse da última década

Nunca o brasileiro buscou tanto por termos relacionados a transtornos mentais quanto durante a pandemia. Dados inéditos fornecidos pelo Google apontam alta de 98% nas buscas sobre o tema em 2020, ante a média verificada nos dez anos anteriores. 

A pergunta “como lidar com a ansiedade”, por exemplo, bateu recorde de interesse da última década. Em relação a 2019, o crescimento foi de 33%.

Entre as três perguntas mais buscadas em 2020 com a expressão “como lidar”, duas estão relacionadas a ansiedade e depressão. Bateu recorde também o interesse dos brasileiros pelo questionamento do que é a felicidade. Em junho, a pergunta teve o maior volume de buscas dos últimos oito anos.

Para especialistas, o comportamento na internet reafirma o que estudos no Brasil e no exterior já observam: medo, solidão e incertezas trazidas pela pandemia e o isolamento levam a uma alta de transtornos mentais.

“O medo de contrair a doença ou de transmiti-la para familiares do grupo de risco gera ansiedade. A diminuição do contato presencial e dos vínculos, impactos econômicos, sobretudo para os que já tinham menos recursos, e a exposição excessiva a notícias sobre coronavírus aumentam o sofrimento mental”, diz Ives Cavalcante Passos, professor do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Desde abril, ele coordena pesquisa sobre os impactos da pandemia na saúde mental. Mais de 8 mil pessoas estão sendo acompanhadas por questionários online. O objetivo, diz ele, é testar hipóteses, como “observar se esse período está associado ao aumento de ideação suicida e de uso de álcool e drogas”.

Levantamento com base em boletins da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), responsável por autorizar estudos com humanos, mostra que já foram aprovadas 97 pesquisas para investigar efeitos psíquicos da pandemia. 

Algumas buscam medir o possível aumento de doenças como depressão e ansiedade; outras querem medir o impacto psicológico em grupos específicos, como profissionais de saúde, crianças e adolescentes, idosos e gestantes. Alguns também investigam quais fatores podem reduzir o risco de um transtorno mental neste período.

Algumas pesquisas já têm respostas preliminares. Estudo da Universidade Estadual do Rio (UERJ) verificou que profissionais com mais dificuldade financeira e os que não podem trabalhar de casa têm mais prevalência. 

“Donos de comércio, administradores, empresários têm prevalência de depressão 50% maior do que a média da amostra. Profissionais que precisam sair para trabalhar e estão mais expostos ao risco de contaminação também têm pior saúde mental”, diz Alberto Filgueiras, professor de Psicologia da UERJ, que coordena o estudo.

Idosos também têm maior risco. A Unicamp inicia neste mês pesquisa com 136 pessoas maiores de 60 anos para verificar o papel da rede de apoio na redução do risco de depressão e ansiedade. Paralelamente, alunos e docentes fazem, desde maio, um projeto de escuta, por ligações semanais, com idosos que já integravam um projeto da instituição. 

“O idoso já tem probabilidade maior de depressão pelos processos associados ao envelhecimento”, diz Daniella Pires Nunes, professora da Faculdade de Enfermagem da Unicamp. 

“A devolutiva dos idosos tem sido interessante. Comentaram que sentem-se ouvidos, acolhidos, animados. Gera sentimento de valor ter alguém para ouvi-los sobre anseios e medos e até dividir coisas do cotidiano, como hobbies, receitas.”

Ajuda
Para Ives Passos, é importante estar atento a sinais e sintomas persistentes. “Medo e tristeza são emoções básicas e fazem parte da vida de todos. Quando ocupam a maior parte do dia e são acompanhados de outros sinais, como alterações no apetite, sono e falta de energia, é necessário consultar um profissional.” 

Ele diz que, apesar do tabu, o número de pessoas que buscam ajuda para si um parente ou amigo tem crescido. A alta de buscas no Google indica percepção do problema. “É importante, porém, que qualquer intervenção seja feita com auxílio de um profissional.”

Segundo Marco Túlio Pires, coordenador do Google News Lab no Brasil, muitos usuários veem na plataforma oportunidade de se informar sobre questões pessoais e íntimas sem julgamentos. 

“Alguns ficam constrangidos em falar sobre certos assuntos até mesmo com pessoas próximas e usam o Google para buscar mais informações. Se isso já acontecia antes, com o isolamento ficou mais intenso.” O Google, afirma ele, tem aprimorado algoritmos e feito parcerias com especialistas para dar informações de qualidade e confiáveis sobre saúde. “A ideia é priorizar fontes oficiais, autoridades no tema.”

Desde 2016, a plataforma tem parceria com o Hospital Albert Einstein na produção de conteúdo. Ao buscar o nome de uma doença, um painel surge do lado direito da tela com informações de sintomas e tratamento.

Para a psicóloga Cristina Laubenheimer, vários fatores têm levado à ansiedade extrema, e a mudança nas relações humanas traz impacto. “De repente, quem antes era seu conforto passa a ser ameaça. Isso gera conflito grande.” 

Em junho, estudo da Ipsos em 16 países mostrou que o Brasil é o que mais sofre com ansiedade na crise sanitária. Dos brasileiros, 41% lidam com o problema. As mulheres são as mais afetadas (49%).

Dicas para a saúde mental
Horários: Estabeleça horário para dormir e, uma hora antes, desligue computador, celular e TV, para se desconectar de situações de estresse. Defina horários para refeições, com equilíbrio nutricional.
Intervalos: Faça pausas de relaxamento de 2 a 3 vezes por dia. Cinco minutos para um exercício de respiração ajuda a oxigenar o cérebro e baixar o estresse no corpo.
Ginástica: Faça atividade física. Há apps que indicam exercícios rápidos e de baixa intensidade. Ioga e meditação também ajudam.
Sintomas e ajuda: Atenção a sintomas persistentes que indiquem depressão e ansiedade. Medo e tristeza constantes, e associados a mudanças de sono, apetite e falta de energia, podem revelar problemas. Busque auxílio profissional.

As informações são do jornal “O Estado de S. Paulo”.


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