Bancos digitais oferecem contas com rendimento automático; Vale à pena?

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  • Publicado em 16 de março de 2020 às 08:22
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 20:29
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É importante entender o seu perfil de investimento e o seu grau de aceitação de risco

Antes mesmo de as fintechs e bancos digitais surgirem, os bancos tradicionais ofereciam a aplicação automática do saldo da conta para que o dinheiro rendesse alguma coisa. A questão é que esse “alguma coisa” costumava ser muito pouco.

Os bancos prometiam algo como 80% do CDI (Certificado de Depósito Interbancário, que segue a taxa básica de juros), mas após o desconto de impostos, esse retorno era quase nenhum. Isso sem falar da cobrança de até 4% de taxa de administração pelo serviço.

Não precisa dizer mais nada: era um produto muito ruim. Até mesmo a caderneta de poupança acabava sendo mais vantajosa, já que possui isenção tributária.

Os bancos digitais reempacotaram a ideia e, agora, oferecem serviços com o mesmo propósito, mas com condições melhores.

“Os bancos digitais decidiram oferecer as contas com rendimento automático para estimular o cliente a manter o dinheiro na conta corrente e a fazer seus pagamentos pelas suas plataformas. É uma forma de fidelizar o cliente e ampliar as receitas com outras frentes, como o pagamento de boletos”, explica Ricardo Rocha, professor de finanças do Insper.

Veja as opções de contas com rendimento automático disponíveis e se vale a pena deixar o dinheiro nessas opções ou não.

Veja abaixo o perfil dessas contas:

Nubank

O banco digital oferece duas opções de rendimento automático. O primeiro é o tradicional, que vale para todas as contas de pagamento da instituição. A ferramenta usada para o rendimento é a aplicação dos saldos das contas em títulos públicos no Tesouro Direto. 

Nessa equação, o banco garante um rendimento equivalente a 100% do CDI, mas as aplicações não são garantidas pelo FGC (Fundo Garantidor de Crédito), que cobre até R$ 250 mil em caso de quebra da instituição.

A outra opção é a que aplica o saldo das contas em RDBs (Recibos de Depósito Bancário) do próprio Nubank. Esse título, que é muito similar ao CDB (Certificado de Depósito Bancário), tem garantia do FGC

O rendimento é igual, 100% do CDI. A vantagem em relação à poupança está aí: a caderneta paga só 70% do CDI.

Mas atenção: nos dois casos da NuConta, a promessa não é de rendimento líquido. O IR (Imposto de Renda) incide sobre o rendimento, e a alíquota varia de 22,5% (para investimentos resgatados em até 180 dias) a 15% (para resgates após 720 dias). 

IOF (Imposto sobre Operações Financeiras)  é mais agressivo ainda: ele vai de 96% do rendimento (para resgate após 1 dia da aplicação) até 3% (para resgate após 29 dias da aplicação). A partir do 30º dia não há cobrança de IOF.

A aplicação automática do saldo das contas tem liquidez diária — isso significa que o correntista pode fazer pagamentos, transferências e movimentar a conta livremente — e rende em todo o período. 

Se o investidor deixar o dinheiro parado por cinco dias, ele vai receber o rendimento proporcional, com os descontos tributários.

PagBank

Só de falar o nome da conta, a música do comercial já vem à cabeça. A conta rendeira foi uma grande sacada de marketing do banco digital: como diz a propaganda, a aplicação automática rende mais que a poupança.

Mas é importante dizer que a conta rendeira do PagBank guarda uma semelhança com a boa e velha caderneta. 

O rendimento só acontece no “aniversário” da aplicação. Isso significa que o investidor só vai receber o retorno se deixar o dinheiro parado por 30 dias completos. 

Ele até pode movimentar a conta, mas o rendimento será calculado de acordo com o saldo que estiver disponível no 30º dia, a partir da aplicação.

Vamos para um breve exercício: se você tinha R$ 1 mil aplicados na conta rendeira, mas usou R$ 900 para pagar contas, ao longo do mês, deixando só R$ 100 aplicados, o rendimento será calculado só com base no saldo de R$ 100.

E não faz diferença nenhuma se você usou os outros R$ 900 na véspera do aniversário. Se você zerar o saldo da conta, antes dos 30 dias, nenhum rendimento será creditado.

O instrumento usado pelo PagBank é o mesmo da NuConta: aplicação em títulos do Tesouro Direto, com rendimento de 100% do CDI. Nesse caso, a instituição garante que os 100% já são o rendimento líquido.

Se fosse bruto, o retorno seria de 109% do CDI, uma vez que a conta rendeira sofre os mesmos descontos de IOF e IR que já mencionamos acima.

Vale a pena ou não?

O Ricardo Rocha, professor de finanças do Insper, explica em quais situações essas aplicações automáticas valem a pena e quais cuidados tomar.

“É uma opção para quem não conseguiu ainda organizar o fluxo de entrada do salário e de pagamento de despesas”, diz o professor. Ele reforça uma mensagem importante: é melhor usar uma conta de rendimento automático do que deixar o dinheiro parado na conta corrente.

A ideia de o dinheiro render é ao menos proteger sua renda do avanço da inflação. A questão é que, em muitos casos, as contas de rendimento automático não cumprem esse papel.

No caso do PagBank, o rendimento completo só acontece se o dinheiro ficar parado, mas é pouco provável que alguém consiga manter o salário na conta durante todo o período — afinal, as contas mensais sempre batem à porta.

Já no caso da NuConta, se o dinheiro for total ou parcialmente resgatado em poucos dias, a cobrança do IR e do IOF mordem quase a totalidade do rendimento. Neste caso, não há retorno que faça frente à inflação.

Mundo ideal. O investidor deve fazer um planejamento de gastos e despesas. Se ele recebe o salário no começo do mês, é melhor que ele tente programar as despesas para essa mesma época.

Mas nós sabemos que algumas contas não podem ter a data de vencimento alterada, como as de água, luz, gás, condomínio e tantas outras.

O ideal é, então, que o investidor aplique o dinheiro durante esse período em que o saldo está positivo e as contas ainda não venceram. Lembrando: nada de dinheiro parado na conta.

Mas o que fazer para o dinheiro não ficar parado? O investidor pode optar por aplicar o dinheiro em um CDB, uma LCI ou uma LCA de liquidez diária, em um fundo de títulos públicos ou pode optar por aplicar diretamente em um título do Tesouro (os mais usados para esse caso são a LTN e o LFT).

Vale mais a pena do que as contas? A conta do PagSeguro perde para todas essas opções, por só garantir o rendimento no “aniversário” da aplicação.

Já o CDB e os títulos do Tesouro têm estruturas e condições iguais às da NuConta, mas estão disponíveis em várias plataformas de outros bancos e instituições. Não faz tanta diferença optar por um ou outro, mas se o investidor for do tipo que esquece de fazer as aplicações manualmente, talvez o ideal seja optar, mesmo, pela aplicação automática.

No entanto é importante dizer que essas contas com rendimento automático são alternativas para um fluxo mensal de dinheiro. Se o seu objetivo for formar uma reserva de emergência ou investir por mais de 30 dias, o leque de opções de investimento se abre, com opções mais adequadas.

Pode falar mais sobre isso? No caso da reserva de emergência, o ideal é priorizar a liquidez — afinal, você não sabe quando pode precisar desse dinheiro. Aqui se aplicam as opções que já mencionamos: letras de crédito privado com liquidez diária (CDB, RDB, LCI, LCA etc.), fundos do Tesouro ou fundos DI. 

No caso dos fundos, é importante ficar atento à taxa de administração cobrada pela instituição financeira.

Se você já tem uma reserva de emergência e esse dinheiro na conta for uma “sobra” mensal, é hora de diversificar a carteira e investir em outros produtos. 

Já que esses recursos não são emergenciais, você pode diminuir a liquidez da equação, o que aumenta o risco e o retorno potencial.

Como investir pensando no longo prazo? Fundos de investimento em geral (multimercado, imobiliário e de ações) são mais atrativos, assim como outros títulos de crédito privado, como debêntures

Mas, antes de diversificar, é importante entender o seu perfil de investimento e o seu grau de aceitação de risco.

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