Área do cérebro responde por ingestão excessiva de alimentos calóricos

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 2 de setembro de 2018 às 00:27
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 18:59
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A descoberta poderá ajudar na criação de tratamentos contra transtornos como bulimia e obesidade

Um dos maiores esforços de cientistas
é encontrar maneiras de evitar o consumo de alimentos calóricos e, de quebra,
as consequências geradas por esse hábito.

Seguindo esse objetivo, pesquisadores
canadenses descobriram que o uso da estimulação magnética transcraniana (EMT)
aumenta temporariamente o desejo por alimentos gordurosos em humanos. Segundo
eles, o resultado do experimento feito com mulheres aprofunda o conhecimento
sobre os mecanismos cerebrais ligados a complicações como obesidade e compulsão
alimentar e poderá ajudar no desenvolvimento de abordagens terapêuticas.

Participaram da pesquisa 28 jovens
saudáveis, mas que relatavam sentir desejo frequente por consumir alimentos com
alto teor calórico. Quando, usando a EMT, foi diminuída temporariamente a
atividade no córtex pré-frontal dorsolateral — a rede cerebral responsável pelo
autocontrole —, 89% das participantes passaram a consumir mais alimentos
calóricos, se comparado ao resultado das sessões de estimulação placebo.

As mulheres também foram convidadas a avaliar uma
série de refeições após serem submetidas à EMT. A maioria classificou lanches
altamente calóricos de forma positiva, prestou mais atenção a imagens atraentes
desses alimentos e relatou impulsos maiores para comê-los. “Isso resultou
também em mais consumo quando lhes foi dada a oportunidade de experimentá-los”,
complementa Peter Hall, professor na Universidade de Waterloo e um dos autores
do estudo.

Hall conta que ele e a equipe têm estudado os
processos cerebrais em autocontrole há anos e que a intervenção experimental
foi o passo lógico do trabalho. “Nossos estudos anteriores usaram a mesma
técnica para suprimir a atividade cerebral no córtex pré-frontal dorsolateral
antes de um indivíduo se alimentar, mas o estudo atual foi o primeiro a incluir
uma técnica de imagem cerebral para examinar as respostas neurais à estimulação
e a imagens de alimentos”, diz.

De acordo com o cientista, o experimento pode
ajudar no desenvolvimento de terapias, já que traz novos dados sobre o
funcionamento do cérebro e sobre como lidar com a fome. “Os resultados podem
não informar diretamente os tratamentos médicos. No entanto, entender como o
cérebro processa informações sobre alimentos altamente calóricos e como os
sistemas de autocontrole modulam isso pode ser importante para determinar como
podemos ajudar pessoas que sofrem de transtornos da alimentação impulsiva, por
exemplo, bulimia, compulsão alimentar e obesidade”, ressalta Hall.

Mais pesquisas ajudarão a entender como a EMT pode
ser usada para interferir no controle cerebral, segundo os autores. Mas eles
destacam que essa não é a única possibilidade de influenciar a funcionalidade
do córtex pré-frontal dorsolateral. “Vários fatores relacionados ao estilo de
vida afetam a função dele — por exemplo, a prática de exercícios aeróbicos. Por
outro lado, a falta de sono e o estresse podem prejudicá-lo”, ilustra Cassandra
Lowe, principal autora do estudo e professora da Escola de Saúde Pública da
Universidade de Waterloo.

Mais estudos

Cláudio Carneiro, coordenador de Neurologia do
Hospital Santa Lúcia, em Brasília, e membro titular da Sociedade Brasileira de
Neurologia, avalia que o trabalho da equipe canadense enriquece uma área da
medicina bastante promissora que tem gerado expectativa na sociedade, cada vez
mais atingida pelo excesso de peso. “O consumo de alimentos calóricos em
excesso é um grande problema. Acredito que especialistas que conseguirem
combater esse comportamento vão ganhar um grande destaque na área, no nível Prêmio
Nobel.”

Usar a EMT em intervenções é uma possibilidade, diz
o médico. “Seria uma maneira de intervir usando uma técnica que já é usada na
área médica para tratar enfermidades”, justifica. “Também acredito que possam
ser criadas substâncias que alterem esse funcionamento cerebral. Porém, ainda é
cedo para dizer. Esse estudo foi feito com uma quantidade reduzida de pessoas,
uma análise mais ampla é necessária para confirmar as descobertas.”

O próximo passo da equipe, porém, terá
uma abordagem mais coletiva. “Examinaremos maneiras pelas quais o ambiente
social torna a implementação do autocontrole mais ou menos provável de ser
bem-sucedida, com foco em alguns desses mesmos sistemas cerebrais”, adianta
Hall.


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