Entenda como a química ajuda a comer de maneira estratégica na festa de Réveillon

  • Nina Ribeiro
  • Publicado em 31 de dezembro de 2022 às 19:00
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Conhecer a composição química dos alimentos pode ajudar a evitar alguns desses excessos que podem fazer mal à saúde além de gerar um desconforto no dia seguinte

Exagerar na ceia de Ano Novo é sempre muito comum, veja como evitar os excessos – foto Freepik

 

As tradicionais festas de fim de ano podem ser uma oportunidade para os exageros na hora de se alimentar.

Conhecer a composição química dos alimentos pode ajudar a evitar alguns desses excessos que podem fazer mal à saúde além de gerar um desconforto no dia seguinte.

Uma das formas de controlar o que vamos absorver depois de comer é saber o que são as fibras alimentares, em que ordem as ingerir e como elas funcionam durante a digestão.

As fibras alimentares podem ser divididas em dois grupos: solúveis e insolúveis, como explica o professor Marcos Buckeridge, do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP).

“A grande maioria das fibras alimentares vem das plantas e consiste em polímeros de açúcares (polissacarídeos) que ficam nas paredes celulares de todas as células vegetais”.

“Então, vamos entender melhor: as fibras insolúveis constituem polissacarídeos como a celulose e as hemiceluloses, que por interagirem fortemente entre si não dissolvem em água facilmente”.

“Já as pectinas (componentes importantes nos frutos), ao contrário, se dissolvem com relativa facilidade, mesmo em água fria, e são, portanto, parte do grupo das fibras solúveis”, explica.

Diferenças dos tipos de fibras

De acordo com o especialista, as funções desses dois tipos de fibras na alimentação são distintas nos alimentos que consumimos.

“Faz diferença também a forma que são preparados. Podemos consumir uma fruta fresca ou um suco de frutas, tomates na salada ou molho de tomate. Até o cafezinho tem fibras e o modo como se prepara também faz diferença”, acrescenta.

As fibras insolúveis têm uma função mecânica mais acentuada e servem para dar maior consistência ao bolo alimentar.

Sem esse tipo de fibra os seres humanos provavelmente conseguiríamos digerir muito pouco dos alimentos consumidos além de permanecer em um estado de diarreia constante.

“O outro extremo, isto é, um excesso de fibras insolúveis, causaria constipação, pois o bolo alimentar ficaria cada vez mais sólido”.

“Portanto, nós, humanos, somos adaptados a ingerir um certo balanço de fibras solúveis e insolúveis tal que mantenha o trânsito dos alimentos pelo sistema digestivo imperceptível. É importante ter um balanço entre os alimentos consumidos”, pontua.

Já as fibras solúveis participam ativamente da função mecânica, mas além disso, por apresentarem solubilidade mais alta em água e alta viscosidade, dificultam o trânsito de moléculas dentro do bolo alimentar.

O professor da USP explica que, por esse motivo, essas fibras “capturam” parte dos açúcares simples e gorduras, e evitam que elas sejam absorvidas em excesso.

“Acredita-se que quando nos alimentamos de fibras, forma-se uma camada viscosa na superfície interna do intestino, denominada camada e água não-agitável, que exerce a função de ‘filtrar’ o que é absorvido”.

“Se esse efeito é bom ou ruim para quem ingere fibras depende de quanto e de qual o tipo. Depende também da ordem que adotamos para comer durante as refeições”, diz.

Estratégias na hora da ceia

Começar pela salada faz sentido, segundo o especialista. Como as folhas têm boa mistura de fibras insolúveis e solúveis, esses materiais não só irão dar um suporte físico melhor ao bolo alimentar, mas com as fibras solúveis ricas em pectinas, acabam ajudando na formação da camada de água não agitável, criando uma espécie de filtro que controla a absorção do que vem depois.

“Com isso, já se sabe que ao comer fibras antes dos doces que vêm na sobremesa, o pico de açúcar no sangue será menor”.

“O mesmo acontece com as gorduras. Isso ocorre porque a estrutura complexa de polímeros da parede celular forma uma rede que captura moléculas menores. O cafezinho ao fim da refeição irá adicionar mais fibras solúveis e tanto melhor se não for adoçado”, diz.

Os frutos contêm mais fibras solúveis enquanto folhas e raízes contêm mais fibras insolúveis. As sementes apresentam em geral um equilíbrio entre os dois tipos de fibra, explica o professor.

No caso dos frutos, em geral, há ingestão de uma quantidade maior de açúcares, o que será equilibrado na ingestão pela grande quantidade de pectinas (fibras solúveis).

Já as sementes têm outras características: são armazenadoras de proteínas ou de gorduras e as fibras insolúveis acabam modulando a digestão de outra forma.

“Temos ainda de lembrar que tudo muda se o alimento for cozido. Nesse caso a proporção de fibras solúveis se torna maior. No caso dos alimentos processados como sorvetes, iogurtes e sopas prontas, há sempre a adição, mesmo que em pequenas quantidades, de polímeros que funcionam como fibras”, conclui.

Resumindo:

– fibras estão na parede celular das células vegetais e têm composição química e propriedades diversas,
– fibras podem ser divididas em dois grandes grupos: solúveis e insolúveis,
– as insolúveis se correlacionam mais com função mecânica e as fibras ajudam a formar camadas viscosas nas paredes intestinais: a camada de água não-agitável,
– o cozimento pode alterar a proporção de fibras solúveis e insolúveis em um dado alimento.

*Com informações do Jornal da USP


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