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Série tem roupagem contemporânea e toca em temas que estão em pauta como racismo e feminicídio
Uma tempestade inunda a cidade. Sem poder sair da sede do teatro onde ensaiam uma nova peça, atores da Noturna Companhia de Teatro se reúnem no centro do palco e começam a contar histórias de terror.
Por meio dessas experiências, viajam por diferentes lugares: uma casa às margens do rio Negro, no Amazonas; o canteiro de obras de um prédio que está prestes a desabar; uma praia frequentada por uma misteriosa mulher que nunca tira os óculos de sol e sempre usa um maiô vermelho; entre outros locais.
São nestes cenários que se desenvolvem os seis episódios de “Noturnos”, produção do Canal Brasil com A Fábrica, que estreou recentemente e pode ser vista também no Globoplay — é preciso ter uma assinatura que inclui canais Globo ao vivo.
É a terceira série brasileira que figura entre o terror e o suspense lançada no último mês no país -as outras duas são “Bom Dia, Verônica” (Netflix), e “Desalma” (Globoplay).
“Noturnos” têm um diferencial. Ainda que exista um fio condutor ao longo de toda a narrativa, os seis capítulos mostram tramas independentes – todas elas adaptadas livremente de contos e poemas de um lado menos conhecido e mais sombrio de Vinicius de Moraes (1913-1980).
Marjorie Estiano deixa de lado o jaleco da doutora Carolina, de “Sob Pressão”, para ser a estrela do quarto capítulo da obra, “A Mulher na Sombra”, uma espécie de lado B da famosa e solar “Garota de Ipanema”.
Para a atriz, a série flerta com o momento atual da pandemia ao provocar reflexões “a partir dos nossos medos, do que a gente não conhece, do aprisionamento, do terror que está fora ou está dentro”. O episódio é adaptado dos textos “Conto Carioca” e “Conto Rápido”.
“É uma tragédia [a pandemia] e é uma oportunidade de a gente reavaliar mesmo esses medos […] Quando ficamos assim vulnerável, eles afloram. Coisas que não víamos antes se apresentam, e a gente tem que descobrir como lidar com isso. É um exercício para a vida”, diz.
Para Renato Fagundes, um dos criadores de “Noturnos”, produções de terror são alegorias que permitem abordar assuntos “atemporais e universais”. “Estamos lidando com medos que vão além da morte, que são medos de deixar de ser humano, de deixar de ver o outro como humano.”
A série ganhou uma roupagem contemporânea e toca em temas que estão em pauta como racismo, feminicídio, luta de classes, entre outros.
O episódio estrelado por Marjorie, por exemplo, pode suscitar reflexões sobre a violência contra as mulheres, ainda que a atriz tenha dito não ter elaborado a sua personagem pensando especificamente sobre esse assunto.
“Todos os episódios de ‘Noturnos’ têm muitas possibilidades de reflexão […] Penso que o feminicídio é um dos grandes horrores que a gente vive, especialmente aqui no Brasil, e trazer isso como discussão em qualquer situação é sempre uma possibilidade de avançar para tirar esse véu desse horror e poder transformar”, afirma a atriz.
O ator Ícaro Silva, que faz parte do elenco fixo como Marcus, diz que seu personagem destaca a linha tênue que separa a realidade da ficção.
“Eles estão naquele teatro, vivendo várias histórias em uma só noite. Fico pensando que nessa pandemia é como se a gente tivesse há muitas noites vivendo uma única história”.
Para ele, a realidade do Brasil é de horror, e “Noturnos” é uma forma de também se refletir sobre isso. “Vivemos a estrutura da violência diariamente. Ser preto no Brasil é uma história de terror, ser travesti é uma história de terror, ser mulher é uma história de terror, quantas histórias de terror a gente vive?”, indaga.
Além do ator e de Marjorie Estiano também estão na série Andrea Marquee, Rafael Losso, Vaneza Oliveira, Bernardo de Assis, Larissa Siqueira, Rogério Brito, Eduardo Gomes, Edgar Castro, Bruno Bellarmino e Gilda Nomacce. A direção-geral é de Marco Dutra e Cateano Gotardo, criadores da produção ao lado de Renato Fagundes.