Novas técnicas podem detectar adulterantes misturados ao café moído

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 8 de fevereiro de 2018 às 10:01
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 18:33
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Novas técnicas permitirão aos órgãos de fiscalização detectar com mais eficácia adulterantes no pó de café

A adição de outros
materiais vegetais ao café torrado e moído será mais facilmente desvendada por
meio dos novos métodos de detecção desenvolvidos por pesquisa da Embrapa
Agroindústria de Alimentos (RJ) e parceiros. As novas técnicas permitirão aos
órgãos de fiscalização e de controle de qualidade detectar, com mais eficácia,
adulterantes misturados ao pó de café.

Método identifica
adulterantes em tempo real

De acordo com os
pesquisadores da Embrapa Edna Maria Moraes Oliveira e Otniel Freitas Silva,
líderes da equipe de cientistas do projeto, os métodos desenvolvidos pela
pesquisa apresentaram rapidez, precisão e especificidade para detectar e
identificar os adulterantes mais comuns adicionados ao café torrado e moído,
como milho, arroz e cevada. Também mostraram capacidade de aferir a quantidade
de adulterante presente em cada amostra além de alta sensibilidade, capaz de
detectar até pequenas quantidades de adulterantes.

Os métodos de base
molecular identificam sequências específicas, os marcadores moleculares,
previamente selecionadas do genoma (DNA) dos adulterantes mais comuns. Esses,
torrados e moídos como o café, são de difícil detecção pelos métodos utilizados
atualmente, baseados na visualização por microscopia e macroscopia das
características visuais de cores e imagens de cada produto adulterante em
teste, o que depende muito da experiência do analista.

De acordo com Edna
Oliveira, “os métodos convencionais não são específicos para café ou para os
adulterantes mais utilizados nesse produto, ou seja, não permitem identificar
os adulterantes individualmente. Já a técnica PCR em tempo real vem sendo
amplamente utilizada para a análise de sequências específicas de DNA de
diferentes matrizes alimentares”, ressalta. A PCR, sigla para reação em cadeia
da polimerase, é uma das técnicas mais utilizadas em laboratórios de pesquisas
médicas e biológicas (veja quadro no fim da matéria).

Método baseado em
Cromatografia Líquida e Espectrometria de Massas

O outro método
desenvolvido é baseado em Cromatografia Líquida de Ultra Eficiência e
Espectrometria de Massas, que utiliza os aparelhos Cromatógrafo Líquido de
Ultraeficiência acoplado a Espectrômetro de Massas UPLC/MS-MS – e oferece
resultados mais rapidamente e com maior precisão. Esse está em fase de
validação qualitativa. A pesquisadora Ana Cristina Gouvea, colaboradora
envolvida no projeto por meio de uma bolsa do Programa de Bolsas e Auxílio do
Consórcio Pesquisa Café, ressalta o ineditismo da utilização da análise por
UPLC/MSD-MS de marcadores de açúcares característicos das matrizes dos
principais adulterantes em café (arroz, soja, cevada e milho). “É uma inovação
científica”, comemora.

No início do desenvolvimento
do método, foram identificados os açúcares presentes nas matrizes de cada
adulterante-alvo. A análise havia sido iniciada por Cromatografia Líquida e
detector convencional por meio de Índice de Refração, pela analista da Embrapa
Manuela Santiago, que constatou que não o não atendimento foi devido à baixa
concentração dos açúcares presentes nos adulterantes. A aprovação do atual
projeto deu início ao desenvolvimento do método qualitativo sob a
responsabilidade da pesquisadora Renata Borguini. O estabelecimento dos
parâmetros do Espectrômetro de Massas foi realizado no mestrado do bolsista
Víctor de Carvalho, sob orientação do pesquisador Ronoel Godoy no programa de
pós-graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos da Universidade Federal
Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).

Foi estudada a
fragmentação das moléculas dos adulterantes por meio da quebra das moléculas
dos açúcares no espectrômetro de massas. “Isso gera quebras em fragmentos
específicos correspondentes ao peso molecular de cada substância-alvo, pois a
estrutura de cada açúcar é diferente (para cada adulterante)”, explica. Para
chegar a esse resultado, a equipe dedicou especial atenção ao aperfeiçoamento
da etapa de extração, buscando alcançar um processo muito seletivo. “O segredo
está na extração e purificação que garantam que outras substâncias não estejam
presentes e ‘encubram’ os marcadores. Com o aperfeiçoamento da extração,
conseguimos observar os íons requeridos, os marcadores”. Depois, foi testada
com sucesso a detecção desses marcadores em amostras de café misturadas com
adulterantes em proporções de 0,2%, 1%, 5% e 25%. “É um método robusto e de
alta sensibilidade. Foi capaz de detectar a presença de apenas 0,2% de
adulterante,” afirma a especialista.

Mercado mais
exigente

A exigência dos
consumidores foi uma das principais motivações para a elaboração do projeto,
que busca contribuir para a evolução do mercado de café no Brasil. O Consórcio
Pesquisa Café financia a pesquisa, que conta também com recursos do programa
especial Capes-Embrapa da Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior (Capes), que oferece bolsas para pós-graduação; além de projeto
financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq).

Elaboração de
material de referência

Para o desenvolvimento
de métodos quali-quantitativos é necessário o uso de materiais de referência,
que, no caso de adulterantes em café torrado e moído, são inexistentes. O
projeto previu a elaboração desses materiais, desenvolvidos pela doutoranda em
Alimentos e Nutrição Cinthia de Carvalho Couto, sob a orientação do pesquisador
da Embrapa Otniel Freitas Silva. Inicialmente, o material de cada espécie de
café (Coffea Arabica e Coffea Canephora) foi selecionado, torrado, moído e
padronizado o tamanho de suas partículas, seguido da elaboração de materiais
com diferentes proporções de café arábica e robusta (100% de uma espécie e
misturas com 95%, 50%, 25% e 5%). “O café gourmet, por exemplo, tem que ser
100% arábica”, lembra Cinthia. “Este material de referência só tem aqui. Ele
foi padronizado para esta detecção e não para outros analitos,” completa.

A esses materiais
serão adicionadas quatro matérias-primas vegetais torradas e moídas – arroz,
milho, soja e cevada – que serão submetidas a ensaios interlaboratoriais,
envolvendo outras instituições parceiras como Instituto Nacional de Controle de
Qualidade em Saúde (INCQS) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o Laboratório
Nacional Agropecuário em Minas Gerais (Lanagro-MG), para verificar se em tais
materiais de referência essas instituições vão detectar os adulterantes, mesmo
utilizando diferentes métodos. Os materiais de referência também serão
utilizados para testar um método de diferenciação em blends contendo as duas
espécies de café.


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