Franca e Ribeirão estão entre as 5 cidades com mais mortes no trânsito

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 11 de março de 2019 às 20:48
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 19:26
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Motociclistas e pedestres, entre 18 e 40 anos, são as principais vítimas fatais, segundo Infosiga

Franca e Ribeirão Preto estão entre as cinco cidades paulistas com maior
taxa de mortalidade no trânsito, segundo levantamento feito pelo Departamento
de Engenharia de Transportes da Escola de Engenharia da USP em São Carlos (SP).

O ranking aponta que Franca registrou no ano passado 9,13 mortes por 100
mil habitantes, enquanto em Ribeirão o mesmo índice é de 8,78 óbitos – os
pesquisadores contabilizaram apenas as fatalidades nas vias municipais, cuja
gestão é das prefeituras.

O relatório considera dados do Sistema de Informações Gerenciais de
Acidentes de Trânsito do Estado de São Paulo (Infosiga) e do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE).

Em números absolutos, Ribeirão registrou 92 acidentes fatais, ficando
atrás apenas da capital e de Campinas. Desse total, 42 casos foram considerados
homicídios culposos, ou seja, quando o condutor não tinha a intenção de matar,
mas cometeu algum tipo de imprudência.

Em Franca, 55 pessoas morreram em decorrência de acidentes de trânsito
no ano passado – aumento de 14,5% em relação a 2017, com 48 vítimas fatais. Na
cidade, o índice de homicídios culposos é maior: os 36 casos registrados pela
Polícia Civil representam 65,4% do total.

O engenheiro de tráfego e professor da Universidade de Franca (Unifran)
Fernando Velazquez explica que a imprudência é a principal causa dos acidentes
de trânsito. Segundo ele, mais do que uma questão educação no trânsito, o
desrespeito às leis é cultural.

Levantamento feito pela Transerp – empresa que gerencia o trânsito e o
transporte público em Ribeirão – comprova aumento de 2,8% nas multas aplicadas
a motoristas que transitam até 20% acima da velocidade permitida e alta de 1,6%
nas autuações por dirigir usando o celular.

Já o número de multas aplicadas a condutores que estacionam em locais
impróprios, sejam eles proibidos ou exclusivos para deficientes, idosos, etc.,
passaram de 6.394, em 2017, para 7.690 no ano passado, o que significa um
aumento de 20%. “O que os motoristas não entendem é que tem uma pessoa dentro
do outro carro. As pessoas estão muito apressadas e não conseguem entender que
estão dividindo o espaço, que é público, com outras pessoas. É mais do que um
estudo de engenharia, é um estudo psicológico. Não é só educação, é cultural”,
diz.

Frentista em um posto de combustível na Avenida Francisco Junqueira,
Paulo de Oliveira concorda com a afirmação do especialista, contando que
diariamente flagra diversos tipos de infrações de trânsito, principalmente
motoristas que desrespeitam o semáforo. “Todo mundo anda muito apressado e todo
mundo acha que tem mais direito que o outro. Motorista fechando cruzamento é
todo dia em horário de pico. Às vezes, tem gente que fica cinco, dez minutos
para atravessar a rua e não consegue, porque os carros não deixam”, diz.

O engenheiro de tráfego explica que pedestres, ciclistas e motociclistas
são as maiores vítimas do trânsito. Dados do Infosiga comprovam que entre as
mortes registradas em Franca no ano passado, 85% estão relacionadas a esses
três grupos. Em Ribeirão, essas vítimas são 80% do total. “As condições de
trafegabilidade são péssimas. Fazem apelo para a faixa de ciclismo aos
domingos, mas aquilo é uma besteira. Se ainda fosse um sistema de ciclovia,
para que as pessoas fossem trabalhar de bicicleta e não só brincar ao final de
semana”, diz Velazquez.

Os dados do Infosiga também apontam que a maioria dos acidentes em
Ribeirão e Franca no ano passado ocorreu entre sexta-feira e domingo, em vias
públicas municipais, entre 18h e 6h. Além disso, a maioria das vítimas fatais
tem entre 18 e 40 anos de idade.

Para o engenheiro de tráfego, os números podem estar associados ao
consumo de bebida alcoólica aos finais de semana. Velazquez diz que, entre 2008
e 2009, quando a “Lei Seca” foi instituída, houve queda nas mortes no trânsito
relacionadas à embriaguez ao volante. “Foram passando os anos, as pessoas
ficaram acomodadas, a fiscalização começou a ser incipiente e a curva começou a
subir. Então, é um padrão comportamental. A gente tem uma cultura, se comporta
e divide o espaço coletivo de forma diferente de outros países”, afirma. 

Transporte público

O aumento da frota também está relacionado ao risco de
acidentes. Dados do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) apontam que o
número de veículos nas ruas de Franca e de Ribeirão cresceu 64% e 58%,
respectivamente, nos últimos 10 anos. O índice é superior ao registrado na
capital paulista, onde o aumento no mesmo período chegou a 42%.

Enquanto
o total de veículos circulando em Ribeirão passou 335.364, em dezembro de 2008,
para 529.565, no mesmo mês do ano passado, em São Paulo (SP) o aumento foi de
5.804.566 para 8.295.645.

Em Franca, havia 159.857
veículos, em 2008, e 262.227 no fim de 2018, ainda segundo o Denatran. “Você
tem um modelo de cidade que já não comporta mais. As cidades estão construídas,
não tem mais para onde crescer e só aumenta o número de carros. As
concessionárias querem vender, as montadoras querem vender. Não tem jeito, vai
ter congestionamento, vai ter acidente”, diz.

Nesse sentido, o engenheiro de
tráfego destaca a importância de os governos implementarem sistemas de
transporte público que sejam eficientes e de qualidade.

Velazquez destaca que,
enquanto um ônibus urbano é capaz de levar 70 passageiros, ou mais, um carro
popular transporta, no máximo, cinco pessoas. “A cidade de Ribeirão não tem
apelo para outros modos de transporte. Se tivesse uma frota de ônibus maior e
mais otimizada, que valesse a pena usar, e não sair de moto ou de carro, com
certeza colocaríamos as pessoas em uma exposição menor aos acidentes”, afirma.

Especialista em planejamento e gestão de trânsito, Luiz Gustavo Correa
concorda com a explicação, destacando que a frota de motocicletas em Ribeirão
só perde para a da capital paulista.

Até dezembro, segundo o Denatran, a cidade somava 137.474 motocicletas e
motonetas. “Se eu não consigo ir para trabalho com transporte público com
qualidade, vou comprar uma moto. É mais barata que o carro, fácil manutenção e
econômica. Só que a motocicleta tem um risco maior de acidentes,
principalmente, quando a gente tem ruas esburacadas. Melhoria do transporte
público é para tirar veículos das ruas”, diz.

Correa critica o projeto anunciado pela Prefeitura de Ribeirão de
construir 30 quilômetros de ciclovias até 2020.

O especialista faz uma comparação com São José dos Campos (SP), que tem
número de habitantes equivalente, mas possui 170 quilômetros de vias exclusivas
para ciclistas. “Ribeirão está atrasada em opção para que o cidadão transite,
que não seja de carro. Na minha opinião, é um absurdo falar que vai fazer 30 quilômetros
em uma cidade do tamanho de Ribeirão. Teria que ser cinco vezes mais. Ribeirão
Preto tem grandes avenidas que podem ser aproveitadas. Está fácil de ser
feito”, afirma.

Mobilidade Urbana

Os especialistas citam que o projeto viário e as condições
das vias urbanas, bem como a sinalização de trânsito, também interferem no
índice de acidentes.

Isso significa que ruas
esburacadas – que são comuns em Ribeirão – oferecem mais risco de colisões e
quedas, por exemplo. “Além de aumentar o número de acidentes, aumenta também a
insatisfação dos motoristas. Dependendo da rota, se tiver muito buraco, o
motorista vai usar outra para ir mais rápido. Quando há uma rota definida e
nela tem uma quantidade maior de veículos, você vai se expor mais”, explica
Velazquez.

Nesse sentido, o Projeto de
Mobilidade Urbana que está sendo executado com verba do Programa de Aceleração
do Crescimento (PAC 2), ao custo de R$ 310 milhões, devem contribuir para a
melhoria do trânsito em Ribeirão.

O pacote de obras contempla,
por exemplo, a construção de 56 quilômetros de corredores de ônibus. “Hoje, não
temos nenhuma faixa exclusiva para ônibus. Como fica o atendimento ao usuário?
Só um pedacinho da Rua Américo Brasiliense, que a gente nem considera. É um
pedacinho que não traz vantagem para o transporte público”, critica Correa.

Ao mesmo tempo, os dois
especialistas concordam que as obras viárias sozinhas não solucionam o
problema.

Projetos de educação e
conscientização são fundamentais para mudar a realidade do trânsito e reduzir
os índices de acidente. “Não há fiscalização com efetividade e o risco de
acidente aumenta. Não é só fazer programas de educação em datas comemorativas,
véspera de Carnaval, Maio Amarelo, etc. É ter isso todos os dias e atingir
todos os públicos. Hoje, principalmente, os motociclistas, que são a maioria”,
destaca Correa.


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