Falta de mão de obra e encargos sociais dificultam contratação de domésticas

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  • Publicado em 10 de outubro de 2016 às 09:07
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 17:59
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O resultado disso é que procura por diaristas cresce em Franca, fomentando área de atuação

Trabalhando como doméstica há 16 anos, Simone diz que a profissão ainda não é valorizada  (Foto: Ricardo Fernandes)

Elas já foram figuras onipresentes na vida de muitas famílias, mas hoje as empregadas domésticas estão desaparecendo e podem se tornar artigo de luxo nos próximos anos, segundo um estudo do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas – Ipea, que aponta para o fim do emprego doméstico nos moldes convencionais no Brasil, a exemplo do que já ocorreu em países da Europa e nos Estados Unidos. Embora hoje os novos imóveis não contemplem mais a dependência de doméstica, a demanda por uma empregada fixa continua grande e, em Franca, essa dificuldade é sentida pela maioria das famílias que necessita desse auxílio no dia a dia.

Que o diga a contabilista Patrícia Suely de Freitas, 48 anos, que nos últimos dois anos vem tentando encontrar uma profissional para cuidar de sua casa e da família. Sua empregada se mudou para outra cidade com o marido, logo em seguida ela conseguiu outra, mas ela não ficou um mês, dizendo que estava muito cansada. “Depois desta, fiz alguns testes, mas não consigo encontrar alguém que dê certo e que, principalmente, seja de confiança”, conta. Casada e mãe de dois filhos – Pedro Henrique, 22 anos, e Paulo Augusto, 20 anos, após as tentativas de contratação frustradas, Patrícia decidiu ficar sem empregada e tem recorrido à ajuda dos filhos e do marido, além de uma faxineira, para conseguir manter a casa funcionando. “O único inconveniente tem sido o almoço, que agora recorremos à marmita, já que passo o dia fora. Na hora do jantar, sempre damos um jeito”, diz.

Dificuldade comum

Arrumar uma empregada doméstica é uma dificuldade comum a muitas famílias. A maioria das candidatas está preferindo receber como diarista do que como funcionária contratada. “Hoje, sobram vagas já que a procura por uma funcionária mensalista é maior, enquanto há profissionais mais interessadas em atuar como diaristas. Por exemplo: de cada 10 casas em Franca, três têm mensalistas e as outras diaristas”, observa a assistente social e proprietária da empresa Lar Empregos Domésticos e Limpeza em Geral, Elsa Pedro.

Maria Aparecida da Silva, 49 anos, se enquadra nesse novo perfil de profissional. Após trabalhar como mensalista durante 15 anos, há cinco decidiu se tornar diarista. “Mesmo não contando com a garantia de carteira assinada, faço minha agenda, tendo tempo ainda para me dedicar à minha casa e à minha família, sem contar que com as faxinas que faço, meu salário líquido hoje é bem maior”, comenta Maria Aparecida, cujo ganho mensal gira em torno de R$ 1,5 mil.

O sonho de consumo de qualquer empregador doméstico seria encontrar uma profissional confiável, proativa, assídua, pontual, comprometida com o trabalho, interessada em aprender coisas novas, receptiva e organizada. Mas, como já indica a palavra sonho, a realidade não é bem essa, e por isso, as agências de Franca só conseguem encaminhar de 35 a 40% das candidatas que recrutam.

As dificuldades

Há 26 anos no mercado, Elsa revela ter uma média de 25 funcionárias cadastradas por mês, a fim de serem encaminhadas para serviços domésticos. Mas deste número, só metade é selecionada. “Hoje em dia, são várias as dificuldades encontradas por quem deseja contratar uma doméstica, entre elas, a falta de mão de obra e a responsabilidade, ou seja, o comprometimento. Como são elas que escolhem o serviço, não dão o devido valor a ele, dispensando-o por qualquer motivo”, avalia.

Elsa Pedro admite que hoje em dia é cada vez mais difícil encontrar uma empregada mensalista (Foto: Ricardo Fernandes)

A empresária Miryam Bittar sabe bem o que é isso. Ela, que teve domésticas desde que se casou e depois com dois filhos com idades muito próximas, ainda contava com uma babá, se viu sem empregada num período de nove meses e desde que a última resolveu sair, foi difícil acertar novamente. “Sempre fazia entrevistas, mas na verdade, quem me entrevistava eram elas! Durante esse período fui me virando sozinha, até que resolvi voltar a morar no meu apartamento, já que estava em uma casa grande, com áreas de lazer, garagem, jardim. Mudando para esse apartamento, contratei uma faxineira, uma lavadeira e começamos a comer de marmita ou em restaurantes self service”, conta.

Utilizando os serviços de faxineira e lavadeira há quase 10 anos, Miryam só vê vantagens nisso, principalmente com a economia feita. Além disso, a situação exige que todos da casa ajudem, já que é preciso mantê-la em ordem até o próximo dia da faxina. “Meus filhos e meu marido arrumam camas, lavam a louça, deixam os quartos e os banheiros organizados e até se viram na cozinha sozinhos. Só a liberdade de ficar em casa com a família já é uma grande vantagem”, diz ela.

A mão de obra

Beneficiadas pela lei da oferta e da procura, as diaristas estão aproveitando o momento para ganhar mais. Enquanto o preço médio da diária é R$ 85 mais o vale transporte, há quem chegue a cobrar R$ 120. Já o salário de uma mensalista varia de R$ 1 mil a R$ 1,5 mil, embora ainda há aquelas que ganhem o salário mínimo paulista, segundo Elsa.

Há 10 anos Miryam Bittar optou apenas por uma faxineira e lavadeira e se diz muito satisfeita (Foto: Ricardo Fernandes)

Segundo dados do Censo 2010 do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Franca conta com 7.180 empregadas domésticas. Em todo o Brasil, são mais de seis milhões de profissionais. “O trabalho da mensalista engloba tudo na residência: lavar, passar, cozinhar, arrumar e às vezes, pajear crianças, mas depende da casa. Algumas só cozinham e cuidam das roupas, outras cozinham e arrumam a casa, e assim por diante. Já no caso das diaristas, elas se dedicam à limpeza de vidros, portas, janelas, banheiros, cozinhas, enfim, o grosso da casa, e às vezes passam roupas também”, explica Elsa.

Mas para os agenciadores em Franca, ainda falta profissionalismo de ambos os lados nas relações patrão-empregado. Do lado das candidatas, elas buscam salário de acordo com a necessidade, e não com a sua competência ou experiência e desconhecem ou não aceitam alguns direitos do empregador. Este, por sua vez, também não faz cumprir os seus direitos: menos de 1% dos empregadores questionam salários e encargos; inclusive, é cultural não se descontar do empregado o INSS e os 6% das passagens, o que é um erro.

O outro lado

Além disso, do lado das candidatas, as exigências são muitas para o tímido desempenho: querem uma carga horária reduzida – preferencialmente, de segunda à sexta-feira, famílias com poucas pessoas e, de preferência, sem crianças nem animais. Se possível, preferem também não cozinhar. “Sempre foi difícil arrumar domésticas em Franca. Por ser uma cidade industrial, a oferta de empregos e os salários sempre foram altos. Hoje é difícil arrumar pessoas com disponibilidade de dias e competência no serviço”, avalia Miryam, acrescentando que outros fatores que implicam na dificuldade de contratação de domésticas mensalistas são os encargos sociais. “O salário fica inviável, pois acrescenta INSS, 13º salário, férias, transporte, auxílio família e agora também o FGTS. Nossa, quem poderá bancar isso?”, questiona.

Para Simone Cristina de Jesus Silva, 42 anos, são justamente os encargos sociais que têm contribuído para a redução de vagas para empregadas mensalistas em Franca. É que ela acredita que muitas famílias preferem as diaristas, justamente para não terem que pagar os direitos trabalhistas em vigor. “A profissão ainda não é valorizada”, diz. Na área há 16 anos, desde que se separou de seu primeiro marido e por necessidade de conseguir um emprego rápido, Simone está há quase cinco anos trabalhando para a família da empresária Regina Ferreira, que ao longo de 16 anos teve quatro funcionárias que permaneceram por mais tempo em sua casa.

Portas abertas

A própria Simone saiu do emprego há um ano por motivos particulares, retornando após tudo resolvido. “Sempre deixo as portas abertas para todas que já trabalharam comigo e sou muito grata a elas”, diz Regina, que apesar de depender totalmente de Simone, quando acontece algum imprevisto, assume o papel de dona de casa sem nenhum problema. “Nessas horas, facilita ser uma profissional liberal, pois posso fazer meus horários”, diz ela.

Regina Ferreira conta com a ajuda de Simone, mas já ficou sem empregada em vários períodos (Foto: Ricardo Fernandes)

Regina admite ter muita dificuldade em encontrar a pessoa certa tanto para sua casa quanto para a empresa, pois cada candidata tem uma particularidade na hora da contratação, seja pela distância, salário, carga horária, currículo, entre outros. Por isso, procura recorrer às agências de emprego. “Mesmo assim, vejo que ainda falta preparo por parte das agências em conhecer o perfil dos próprios clientes, indicando assim, a empregada que mais se encaixa ao trabalho proposto”, afirma a empresária, que acredita ser primordial um treinamento para essas profissionais, principalmente, comportamental.

Por conta disso, a proprietária da Lar Empregos Domésticos e Limpeza em Geral promove treinamentos mensais com as profissionais cadastradas em sua agência, além de fazer uma análise do perfil solicitado pelo contratante com o do profissional, englobando tudo, desde o local onde mora, se tem fácil acesso, idade, referências anteriores comprovadas, entre outros. “A vantagem tanto do profissional como do contratante é que unimos a necessidade do empregador com a experiência do profissional”, diz Elsa, cujo cadastro é composto por profissionais com referências anteriores comprovadas e antecedentes policiais. 


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