Estilo de vida responde por 63 mil mortes por câncer por ano no Brasil

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 11 de abril de 2019 às 16:01
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 19:29
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Um terço das mortes causadas por 20 tipos de câncer no Brasil poderia ser evitado com mudanças nos hábitos

Um terço das mortes causadas por 20 tipos de câncer
no Brasil poderia ser evitado com mudanças no estilo vida. Tabagismo, consumo
de álcool, excesso de peso, alimentação não saudável e falta de atividade
física são fatores de risco associados a 114 mil casos da doença (27% do total)
e 63 mil mortes (34% do total) por ano no Brasil.

Os dados, publicados na revista Cancer
Epidemiology
, fazem parte de um estudo realizado por pesquisadores do
Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de
São Paulo (FMUSP) e da Harvard University, nos Estados Unidos, com apoio
da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

O levantamento aponta, por exemplo, que a incidência de câncer
de pulmão, de laringe, de orofaringe, de esôfago, de colón e de reto poderia
ser reduzida pela metade caso esses cinco fatores de risco fossem eliminados.

Leandro Rezende, pesquisador da FMUSP e um dos autores do
estudo, destaca que não se conhece outra forma de prevenir tantos casos. “O que
nos surpreende é a magnitude de casos e mortes que a gente conseguiria evitar a
partir da redução desses fatores de risco. Esse número deve chamar atenção para
políticas públicas de redução do risco de câncer no Brasil”, disse.

Estimativa da Organização Mundial de Saúde (OMS) indica que, em
2025, os casos de câncer cresçam em até 50% no Brasil em decorrência do aumento
e do envelhecimento da população. Atualmente, a doença é a segunda causa de
morte no país.

O levantamento da FMUSP, contudo, aponta que, além das mudanças
na estrutura populacional, o aumento da prevalência desses cinco fatores de
risco no estilo de vida do brasileiro pode representar novos desafios para o
controle do câncer na população.

Os pesquisadores traçaram estimativas de redução da doença caso
esses fatores sejam reduzidos. “Trabalhamos com algumas metas ou recomendações
que são mais plausíveis de serem atingidas em nível populacional e que estão
presentes em alguns documentos e recomendações por agências internacionais”, explicou
Rezende.

Foi considerado o seguinte cenário: o consumo de álcool com uma
redução relativa de 10%, uma diminuição de 1 kg/m2 no índice de massa corporal
na média da população, uma dieta de cálcio de 200 mg a 399 mg por dia e a
redução de 30% na prevalência do consumo de tabaco.

Essas alterações, do ponto de vista populacional, poderiam
evitar 19.731 casos de câncer (4,5% dos casos) e 11.480 mortes (6,1%).

Políticas públicas

Rezende destaca que essas estimativas contribuem para formulação
de políticas públicas na área de saúde pública.

Ele cita como exemplo o combate ao tabagismo no Brasil que
conseguiu reduzir para menos da metade a proporção de fumantes em relação a
década de 1990. “Hoje, aproximadamente 10% da população brasileira fumam (antes,
eram mais de 30%). Quando o Brasil adotou um pacote de medidas, leis e
regulamentação do tabaco no Brasil, como a tributação do cigarro, a proibição
do consumo em local fechado, a gente teve um impacto bastante positivo na saúde
da população”, disse.

O pesquisador aponta que o tabagismo é responsável por 67 mil
casos de câncer por ano no Brasil, o equivalente a 15,5% dos casos e 40 mil
mortes. “Tem um debate bastante atual de que se deveria reduzir o imposto dos
produtos derivados do tabaco para diminuir o consumo de cigarro contrabandeado.
É importante trazer a magnitude do estrago que o cigarro faz na saúde da
população quando se estimula o consumo. Hoje, o Brasil é um case de sucesso e a
gente, primeiramente, precisa manter isso”, defendeu.

Um grupo de trabalho foi instituído em março deste ano pelo
Ministério da Justiça e Segurança Pública para avaliar “a conveniência e
oportunidade” da redução da tributação de cigarros fabricados no Brasil.

Para Rezende, o combate ao tabagismo poderia servir de exemplo
para a elaboração de outras políticas no campo da alimentação. “Rotulagem,
restrições de marketing e aumento de impostos de produtos da indústria de
alimentos para desestimular o consumo são propostas possíveis de serem
implementadas pegando emprestado o case de sucesso do tabaco para tentar
reduzir o excesso de peso e obesidade da população no Brasil”, sugeriu.

Ele lembra que o Guia alimentar para a População Brasileira, do
Ministério da Saúde, recomenda que sejam consumidos principalmente produtos in natura
e que se evitem alimentos processados, especialmente ultraprocessados.

Metodologia

A pesquisa partiu do consenso na literatura científica de que
cinco fatores de risco – tabagismo, consumo de álcool, excesso de peso,
alimentação não saudável e falta de atividade física – estão associados a 20
tipos de câncer.

O que o novo estudo fez foi calcular a fração atribuível
populacional (FAP) da doença relacionado a dados populacionais sobre o índice
de massa corporal (IMC) elevado, consumo de cigarro, álcool, prática de
atividade física e informações sobre a alimentação.

De acordo com os pesquisadores, a FAP é uma métrica que estima a
proporção da doença possível de prevenir na população caso os cinco fatores de
risco fossem eliminados, mantendo os demais fatores/causas estáveis.

Os dados sobre a distribuição dos fatores de risco do estilo de
vida foram calculados a partir da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) 2013, para
estimar consumo de álcool, índice de massa corporal (IMC), consumo de frutas e
hortaliças, atividade física, tabagismo e fumo passivo entre não fumantes no
Brasil.

Foi utilizada também a Pesquisa Nacional de Orçamentos
Familiares (POF), realizada entre 2008 e 2009 pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), para obter o consumo alimentar de fibras, cálcio,
carne vermelha e processada.


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