Demora no diagnóstico de câncer leva à mastectomia em 70% dos casos

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 6 de maio de 2018 às 22:59
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 18:43
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Queda brusca no número de mulheres que passam pela mamografia está ligada à falta de recursos financeiros

A Sociedade Brasileira de Mastologia
(SBM) tem procurado alertar a população para que as mulheres procurem
fazer os exames de rotina, principalmente mamografia, dentro do prazo médio
estabelecido pelos médicos, pois já é sabido que em 70% dos casos de câncer de
mama diagnosticados no país a mulher passa por uma mastectomia (remoção total
da mama). O principal motivo é que a doença é identificada em estágio avançado.

Para a sociedade, esse índice está
ligado à dificuldade do diagnóstico precoce e demora ao acesso a consultas,
exames, biópsia e tratamento. Pesquisas internacionais apontam que se o tumor é
descoberto logo no início – com menos de 2 centímetros – as chances de cura
podem chegar a 95%, conforme a sociedade. “Isso é um problema muito ligado à
questão econômica com dois problemas básicos: a disponibilidade dos recursos,
dos exames, a qualidade dos equipamentos e dos resultados. A limitação do
acesso é um problema muito sério no nosso país, as mulheres no SUS passam por
uma verdadeira ‘via crucis’ que é conseguir consulta num posto de saúde,
conseguir um pedido de exame e depois realizá-lo. Com o diagnóstico tardio, a
agressividade do tratamento é maior”, disse o presidente da Sociedade
Brasileira de Mastologia, Antônio Frasson.

Para Frasson, a queda na busca pelos
exames está relacionada também ao fato de muitos brasileiros estarem sem
emprego ou terem perdido a cobertura de plano de saúde. “Quando a gente observa
o número de mulheres que vem fazendo exames, esse número, em vez de aumentar,
vem caindo. Isso é muito ligado à questão econômica, questão da falta de
recursos, estamos falando isso no sistema público e no sistema privado. Com a
crise, muita gente perdeu o acesso, o convênio”.

De acordo com o Ministério da Saúde,
estados e municípios têm autonomia para organizar a rede de
atendimento “e o tempo para realizar diagnóstico depende da
organização e regulação desses serviços”. “Em 2017, foram realizados
no SUS 4,04 milhões de mamografias de rastreamento, sendo 2,6 milhões na faixa
etária prioritária preconizada pela Organização Mundial da Saúde, que são
mulheres de 50 a 69 anos.  Além disso, também houve aumento de 100% dos
valores repassados para exames essenciais para o diagnóstico e
para a decisão médica do tratamento
dessa doença”.  Conforme a pasta, o repasse de recursos
federais para tratamento passou de R$ 2,2 bilhões em 2010 para R$ 4,6
bilhões em 2017.

Cirurgias
menos invasivas

Com intuito de preservar as mamas,
médicos têm adotado técnicas que permitem, por meio de um acesso pequeno (pela
borda da aréola e mamilo ou pelo sulco mamário) fazer a retirada dos tumores,
com menor risco de complicações e melhores resultados estéticos.

De acordo com o mastologista,
incisões escondidas podem ser feitas na retirada total da mama ou quando é
retirado somente o tumor com margem livre. Esse tipo de cirurgia evita que a
mulher tenha o estigma de uma cirurgia radical, com cicatrizes no meio do seio.
“A pessoa faz cirurgia, e pode fazer radioterapia, quimioterapia ou
hormonioterapia. A associação das múltiplas terapias faz com que um
tratamento exclusivo seja menos utilizado e isso ajuda muito no avanço das
técnicas cirúrgicas, fazendo com que o tratamento cirúrgico passe praticamente
desapercebido”.

Durante a Jornada Brasileira de
Oncoplástica, ocorrida em São Paulo no mês de abril, profissionais da área
focaram na qualificação de técnicas cirúrgicas de reconstrução mamária.
“Durante o evento, especialistas internacionais e nacionais realizaram as
cirurgias em um hospital e as imagens foram transmitidas ao vivo para uma
plateia de médicos que puderam participar discutindo as melhores opções”, disse
Frasson.

Espera
pela cirurgia

A lei que prevê reconstrução mamária
imediatamente após mastectomia completou cinco anos em abril. A Lei 12.802
prevê que pacientes submetidas a mastectomia têm o direito de realizar a reconstrução
mamária por meio do Sistema Único de Saúde (SUS) imediatamente após a retirada
do tumor. A SBM afirma que apenas 20% das 92,5 mil mulheres que retiraram as
mamas entre os anos de 2008 e 2015 passaram pelo procedimento de
reconstrução. De acordo com a instituição, a reconstrução mamária imediata é
viável em cerca de 90% dos casos.

Em nota, o Ministério da Saúde
informou que “segundo a mesma lei, quando não houver indicação clínica
para realização dos dois procedimentos ao mesmo tempo, a paciente será
encaminhada para acompanhamento e terá garantida a realização da cirurgia
após alcançar as condições clínicas necessárias. Sendo assim, cabe à equipe
médica responsável pela paciente avaliar se é possível realizar os dois
procedimentos no mesmo ato cirúrgico. A decisão é tomada com base em diversos
fatores, como a condição da área afetada para evitar infecção ou rejeição da
prótese e a vontade da própria paciente. Em alguns casos, é necessária a
radioterapia ou quimioterapia antes da reconstrução mamária ser
realizada”.

Conforme o ministério, em 2013, foram
feitas 11.931 cirurgias de mastectomia e 3.411 de reconstrução
mamária no SUS. Em 2017, dados preliminares, foram 10.186 mastectomias e 3.413
reconstruções mamárias. Os investimentos federais para a reconstrução mamária
passaram de R$ 2,21 milhões, em 2013, para R$ 2,39 milhões no ano
passado. 

Há também desconhecimento das
mulheres sobre a legislação. Pesquisa da Federação Brasileira de
Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama), em parceria com o
Hospital Moinhos de Vento, de Porto Alegre (RS), a Johnson & Johnson
Medical Devices e o instituto Ideafix mostrou que de 468 mulheres entrevistadas
apenas 27,6% disseram conhecer bem a lei. Conforme a pesquisa, 74,8% das
entrevistadas que trataram o câncer no sistema privado fizeram a cirurgia de
reconstrução mamária e 53,4% das pacientes do sistema público passaram
pelo procedimento.

“Imediata ou não, a cirurgia de
reconstrução é um direito de toda paciente de câncer de mama que passou por mastectomia
durante o tratamento da doença. Esse direito deve ser exigido junto ao SUS e
aos planos de saúde e discutido com o médico antes da realização da cirurgia ou
a qualquer momento após o procedimento de retirada do tumor, no caso de uma
reconstrução tardia”, disse a presidente da Femama, Maira Caleffi.


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