Corte no Sistema S ameaça pequenas empresas, alerta Tirso Meirelles

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 9 de janeiro de 2019 às 10:51
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 19:18
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Segundo presidente do Sebrae-SP, Tirso Meirelles, proposta de ministro pode deixar 300 mil sem atendimento

O novo presidente do Sebrae-SP, o francano Tirso Meirelles, diz que o corte proposto pelo ministro da Fazenda, Paulo Guedes, nos recursos do Sistema S representará uma ruptura significativa nas atividades da entidade, com impacto direto na sobrevivência dos pequenos negócios.

A ameaça de redução das verbas foi feita por Guedes ainda antes da posse do presidente Jair Bolsonaro. “Tem de meter a faca no Sistema S”, disse o ministro, sobre as nove instituições voltadas à formação profissional em suas respectivas áreas de atuação.

O Sebrae é responsável pela capacitação e apoio aos pequenos negócios. Em 2018, em São Paulo, o orçamento foi de cerca de R$ 400 milhões.

A maior parte dos recursos provém das contribuições que as empresas pagam sobre a folha de pagamento. A receita própria, obtida com a comercialização de produtos e serviços, ficou em R$ 20 milhões.

Para Tirso Meirelles, uma redução de 30% significaria que 300 mil empresas não seriam mais atendidas pela entidade.

Veja a entrevista de Tirso Meirelles:

​P – Em almoço na Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), Paulo Guedes afirmou que é necessário meter a faca no sistema S. O que o senhor achou dessa declaração?

R – O sistema S abarca nove organizações, entre elas o Sebrae. A contribuição que deram e dão para o aumento da produtividade, da competitividade e da geração de empregos e de empreendimentos mais saudáveis, em todos os elos das cadeias produtivas, é significativa. Certamente o ministro da Economia, Sr. Paulo Guedes, que inúmeras vezes reiterou que não quer destruir o que funciona, fez com esta declaração uma sinalização da austeridade que vai pontuar sua gestão. E que contará com todos nós, representantes da sociedade civil, para encontrar caminhos que conduzam para a melhoria do ambiente para empreender.

P – Guedes chegou a dizer que esse corte pode ser de até 50%. O que um percentual como esse afetaria, na prática, as atividades do Sebrae?

R – O Sebrae atende um público que é um dos pilares estratégicos de desenvolvimento socioeconômico do Brasil, por sua forte atuação na geração de emprego e distribuição de renda. Existem hoje 13,8 milhões de microempreendedores individuais (MEIs), micro e pequenas empresas, responsáveis por ocupação de 43,6 milhões de brasileiros e pela geração de 27% do Produto Interno Bruto (PIB). Nos últimos dois anos, essas empresas tiveram um saldo líquido de criação de novos postos de trabalho na ordem de 1 milhão. Apesar dessa importância, sozinhos ainda enfrentam muitas dificuldades; precisam de apoio para melhoria da gestão e da produção e de um ambiente favorável para se manter em atividade e se tornarem competitivos. Para exemplificar: a sobrevivência dos pequenos negócios está diretamente relacionada a algum tipo tratamento diferenciado. Para quem está no Simples – sistema integrado de tributos – a taxa de mortalidade é de 17% nos dois primeiros anos de atividade no mercado; para os não optantes, a taxa sobe para 62%.

O corte proposto, independente do percentual, representará uma ruptura significativa nas atividades do Sebrae, com impacto direto e imediato no tamanho de nossa operação e, por consequência, na quantidade e qualidade de atendimentos e na sobrevivência dessas empresas. Em São Paulo, fizemos as contas para 30% de corte, já para este ano: 300 mil clientes deixariam de ser atendidos, quase 60 mil alunos do ensino fundamental deixariam de ter acesso a lições de cultura empreendedora e cerca de 65 postos municipais de atendimento seriam fechados. Além disso, a reestruturação da operação pode diminuir drasticamente a liberação de recursos para o programa SuperMei, que capacita o microempreendedor em gestão, apóia seu planejamento e dá acesso à linha de financiamento Juro Zero Empreendedor. Estamos falando em menos 20 mil MEIs atendidos e R$ 4 milhões que deixarão de ir para o caixa desses empreendimentos. Outro programa que deverá sentir forte impacto é o de startups. Algo drástico, num momento em que são essas empresas que têm maior potencial de alavancar novas tecnologias, captar recursos e colocar o Brasil em rankings de prestígio na comunidade internacional de inovação.

Mas a conta é muito mais complexa. Como o orçamento 2019 foi inteiramente contingenciado em outubro de 2018, caso o corte dos recursos chegue ainda este ano, ele vai representar muito mais que os 30% ou 50% anunciados, uma vez que teremos que desestruturar programas e projetos importantes. Vamos ter que descobrir um santo para cobrir outro. A médio e longo prazo, ainda não sabemos as repercussões disto, mas estimamos algo em torno de 60% a 80%.

P – O senhor entende que o novo governo subestima a importância do Sistema S para o país?

R – Não acreditamos nisto. É uma questão de tempo para que os novos governantes e legisladores – nos âmbitos nacional e estadual – conheçam mais detalhadamente o trabalho, os resultados e o impacto das atividades do sistema S no comércio, na indústria e no agronegócio dos quatro cantos do país. Por isso, somos favoráveis ao estabelecimento de diálogo franco, objetivo, claro que ajude a construir soluções de aprimoramento do sistema. Estamos vivendo uma nova fase – em nível mundial e local, que não pode prescindir de uma rede já qualificada emcapacitação e consultoria de excelência. Porque começar do zero, se podemos redefinir metas, ajustar o que for necessário, e seguir contribuindo para o desenvolvimento perene do Brasil, inclusive na atração de investimentos internacionais.

P – Qual é o orçamento do Sebrae-SP? Os recursos repassados pela Receita representam quanto nesse orçamento? A diferença é obtida de que modo?

R – O orçamento do Sebrae-SP advém de uma parte das contribuições que as empresas pagam sobre a folha de pagamento (entre 0,3% e 0,6%). Por isso é variável, de acordo com o nível de atividade econômica. Em 2018, foi de cerca R$ 400 milhões. A receita própria ficou em R$ 20 milhões, gerada com a comercialização de produtos e serviços. Esses recursos são destinados a investir em projetos e programas subsidiados, a maioria integralmente, possibilitando melhorias significativas do desempenho dos pequenos negócios.

P – Se houvesse uma redução na contribuição das empresas, o valor seria revertido para a criação de empregos, como acredita o governo?

Ao melhorar a gestão dos pequenos negócios, estamos fortalecendo e tornando competitivos um dos principais pilares na geração de emprego e distribuição de renda. Se em tempos de vacas magras, esses negócios geraram quase 980 mil novas empregos, imagine com os ajustes que estão por vir e que vão simplificar e desonerar o setor produtivo. Acreditamos que esta é uma via importante para continuar criando empregos, em especial para aqueles que têm menor qualificação profissional, que estão em busca da primeira oportunidade e que ainda não têm experiência comprovada. Mas não é a única forma e nem deve excluir outras propostas. Como empresário, acredito que a criação de empregos ocorre à medida que se encontre um ambiente mais propício à sua atividade, desmontando, por exemplo, a estrutura burocrática, que usa incríveis 1.958 horas, ou 81,5 dias para a empresa permanecer aberta e em dia com todas suas obrigações.

P – O Sistema S precisa de ajustes? Há desperdício de recursos?

R – A questão de ajuste de operação e controle do Sebrae está presente em nossa cultura. Vale lembrar que desde 1991, quando o então Cebrae – Centro Brasileiro de Assistência Gerencial à Pequena e Média Empresa se transformou em Sebrae, entidade civil sem fins lucrativos, crescemos e avançamos junto com o Brasil, sempre atentos às necessidades e peculiaridades das micro e pequenas empresas. As estratégias de atuação, planejamento e monitoramento foram se adequando às transformações que pontuaram os últimos 40 anos – globalização e abertura de mercados, crises econômicas, novas formas de consumir e novos consumidores, a interconectividade provocada pela tecnologia –  revolução 4.0. E vamos continuar aprimorando nossos processos, produtos e serviços, investindo recursos onde for preciso, sem desperdícios, para garantir aos nossos clientes a melhoria de sua competitividade.

P – Uma auditoria do Tribunal de Contas apontou que o salário de gerentes e diretores chega a ser duas vezes maior que o salário mais alto para a mesma função no mercado de trabalho. Qual a sua opinião sobre esse dado?

R – Somos uma entidade cujo maior valor é o conhecimento e atualmente 1.035 pessoas trabalham no Sebrae-SP. Nossa política de remuneração segue os princípios norteadores do sistema Sebrae Nacional que já recebeu os pareceres da auditoria do TCU e está estudando as recomendações que ali constam. À título de esclarecimento, informamos que o presidente do Conselho Deliberativo e os demais conselheiros – titulares, suplentes e fiscais – são voluntários, não sendo remunerados de nenhuma forma em suas atividades no colegiado do Sebrae-SP.

P – Quantas pessoas/empresas o Sebrae-SP atende por ano?

R – No ano passado, o Sebrae-SP realizou mais de 2,5 milhões de atendimentos a quase 1 milhão de microempreendedores individuais (MEIs), micro e pequenas empresas e empreendedores potenciais. Vale lembrar que o estado de São Paulo concentra cerca de 4 milhões de pequenos negócios. Ou seja, atingimos 1/3 do total de empreendimentos do país. Além disso, mais de 2 milhões de empreendedores receberam consultoria e capacitação em gestão de negócios. Outra conquista importante foi a ampliação da educação empreendedora. Num momento em que estamos migrando para uma sociedade em que o emprego, da forma que conhecemos, deixará de existir, dando lugar para o trabalho empreendedor, é preciso reforçar a cultura empreendedora em nossos jovens. Em 2018, 180 mil alunos do ensino fundamental receberam gratuitamente o programa Jovens Empreendedores Primeiros Passos.

P – A entidade está presente em quantas cidades do Estado de São Paulo?

R – Estamos presentes em mais de 250 municípios, com uma rede composta de 33 escritórios regionais, 218 postos de atendimento ao empresário, os Sebraes Aqui e 23 unidades móveis que percorrem as cidades em que não existe um ponto fixo. Além disso, temos parcerias com diversas entidades públicas e privadas – prefeituras, associações, sindicatos, universidades – que nos permitem levar nossas ações a um universo cada vez maior de empreendedores, exercendo o papel de agente de desenvolvimento regional.

P – O senhor está otimista com o novo governo?

R – Estamos confiantes que os novos governos – federal e estadual – vão encontrar novos e melhores caminhos para conduzir as políticas públicas que tragam às empresas as oportunidades para se manter no mercado e crescer. O Sebrae continuará de portas abertas para não só mostrar a realidade dos empreendedores no Brasil e nos estados, como também para fortalecer as parcerias que reúnam os esforços e recursos rumo ao crescimento sustentável. Inclusive já iniciamos tratativas com o governo de São Paulo para ampliar as parceiras exitosas que mantemos e realizar outras que reforcem a característica empreendedora do estado, como um programa que garanta a celeridade nos processos de abertura e encerramento das empresas.

Ficha técnica

Nome completo: Tirso de Salles Meirelles

Idade: 54 anos

Quando assumiu o cargo: 02.01.2019

O mandato é de quanto tempo: quatro (4) anos, sem direito à reeleição. Gestão 2019-2022

Resumo profissional: economista, administrador de empresas e empresário rural. É também vice-presidente da Federação da Agricultura do Estado de São Paulo (FAESP) e conselheiro da Companhia de Desenvolvimento Agrícola de São Paulo (CODASP), do Conselho Superior do Agronegócio da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade Estadual Paulista (UNESP) e do Instituto Federal de São Paulo. Tem pós-graduado em Administração de Empresas e em Políticas Públicas pela Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), MBA em Agronegócios (em conclusão), pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Participa ativamente das atividades do SEBRAE-SP desde 2000, como conselheiro, assessor da Presidência e Secretário Executivo do Conselho Deliberativo.


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