Brasil tem mais de 100 candidatos a santos católicos, entenda

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 25 de dezembro de 2018 às 13:25
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 19:16
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Hoje, mais de 130 brasileiros são considerados pela Igreja servos de Deus, veneráveis ou beatos

Florianópolis, 18 de
outubro de 1991. O Papa João Paulo II cumpria uma maratona no país — em dez
dias, visitou dez capitais. Na capital catarinense, aproveitou a celebração da
beatificação de Madre Paulina para encaixar uma opinião pessoal: “O Brasil precisa
de santos, de muitos santos!”.

Foi a senha para o
início de uma força-tarefa que está inserindo cada vez mais compatriotas na
fila pelo título mais prestigiado da Igreja Católica. Por enquanto, poucos
conquistaram a canonização.

Até o ano passado, o único brasileiro a ser declarado santo, com
decreto assinado em 2007 pelo Papa Bento XVI, havia sido o Frei Galvão. O jejum
acabou quando Francisco deu a mesma honraria a 30 mártires do Rio Grande do
Norte.

Também são considerados santos nacionais a Madre Paulina, nascida
na Itália, e o espanhol São José de Anchieta, mas o país corre atrás de mais
reconhecimentos. Por isso, hoje estima-se que cerca de 90 comissões
postuladoras da causa dos santos estejam montando processos de quase cem
candidatos à canonização. 

Os passos para a santidade

É um caminho complexo e demorado. Normalmente, o postulante se
torna um “servo de Deus”, com a abertura do procedimento. Se ele apresentar as
virtudes necessárias, é proclamado “venerável”. Caso se prove um milagre por
sua graça, é beatificado. A canonização acontece com a comprovação de um
segundo milagre.

Hoje, mais de 130
brasileiros são considerados pela Igreja servos de Deus, veneráveis ou beatos.

O Brasil, um imenso país
católico, olha para o exterior e ignora que também abriga santos — avalia o
português Miguel de Salis Amaral, consultor da Congregação da Causa dos Santos
do Vaticano. — A Igreja e a população devem assumir o desafio de
identificá-los. E não se deve procurá-los apenas entre padres e freiras. Até
crianças podem inspirar devoção.

É o caso de Odete
Vidal de Oliveira, a Odetinha, uma menina que viveu na década de 1930 em
Botafogo, na Zona Sul do Rio. A menina, morta aos 9 anos de paratifo, uma
doença de origem bacteriana, impressionou os católicos por suas obras de
caridade. Organizava refeições beneficentes, fazia doações para mendigos e
convenceu os pais a começar uma obra social para meninas órfãs. Hoje, ela é
considerada serva de Deus.

Odetinha chegou ao Vaticano graças à dedicação do padre João
Cláudio, que passou quatro anos montando sua biografia, baseado em entrevistas
com testemunhas, pesquisas de campo e análise de documentos. E assegura que
está pronto para levar o caso a um tribunal eclesiástico, que investigará a santidade
da menina.

Uma pessoa só pode ser
canonizada se for comprovado que ela cumpriu dois milagres. Vi centenas de
relatos interessantes, como pessoas que, após orarem por ela, curaram-se de
câncer terminal e sobreviveram a acidentes e a atos de violência, como
tentativas de assassinato — explica.

João Cláudio integra a Comissão da Arquidiocese do Rio de Janeiro
para a Causa dos Santos, presidida por Dom Roberto Lopes. A equipe, formada em
2011, também conseguiu o título de servo de Deus para Guido Vidal França
Schäffer. O médico e seminarista atendia gratuitamente a moradores de rua. Ele
morreu afogado aos 34 anos, enquanto surfava, em 2009.

— Entrevistamos mais
de 30 pessoas para mostrar o caso de Guido ao Vaticano, e depois será montada
sua biografia oficial. E estamos recebendo milagres que serão apurados por uma
equipe científica. Esperamos que ele e Odetinha sejam os primeiros beatos do
Rio, o último passo antes da canonização — diz Dom Roberto. — Nossa equipe
conversa praticamente todos os dias, e uma vez ao ano há a reunião nacional das
comissões postuladoras de santos.

Dom Roberto assinala que as dioceses estão cada vez mais
organizadas, formando padres e trazendo leigos especificamente para organizar
os trabalhos de canonização. 

Princesa Isabel em 2019

No ano que vem, a comissão
pode iniciar a candidatura à canonização da Princesa Isabel, que assinou a
abolição da escravatura no país em 1888. Mas o processo já provoca
controvérsias, porque uma corrente de historiadores defende que outras pessoas,
que não tiveram uma posição privilegiada na sociedade, foram mais combativos na
libertação dos escravos. Desta forma, seriam mais dignos de reconhecimento.


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