Só 3,3% dos estudantes brasileiros querem seguir carreira como professores

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 15 de outubro de 2018 às 11:44
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 19:05
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Ser professor em escolas de educação básica seria a escolha de apenas 2,4% dos estudantes para a carreira

“Meu sonho mesmo é
dar aula para o ensino médio, pode ser em escola estadual, municipal ou
particular”, diz Lucas dos Anjos Castro, 16 anos, estudante do 2º ano do ensino
médio da Escola Estadual Professor Botelho Reis, em Leopoldina, Minas Gerais.
“Eu me vejo como professor, igual aos meus, na correria, rodando para lá e para
cá, entrando em uma sala e outra. É o que eu gosto”.

O sonho com a carreira docente, como o de Lucas, é cada vez mais
raro. De acordo com levantamento feito pelo Interdisciplinaridade e Evidências
no Debate Educacional (Iede), com base nos dados do Programa Internacional de
Avaliação de Alunos (Pisa) de 2015, apenas 3,3% dos estudantes brasileiros de
15 anos querem ser professores. Quando se trata daqueles que querem ser
professores em escolas, na educação básica, esse percentual cai para 2,4%.

Nesta segunda-feira, 15 de outubro, no Dia do Professor, conheça
as ideias de quem quer seguir a carreira docente e de professores que não abrem
mão da profissão.

“Quando eu contei para a minha mãe, ela me disse: ‘você pode
ganhar mal, como será o seu futuro?’ Eu falei que queria e que se eu não
trabalhar no que quero, não vou ser feliz”, diz Castro.

Um dos professores que influenciou a decisão do estudante foi
João Paulo de Araújo que, além de lecionar história na Escola Estadual
Professor Botelho Reis, trabalha também na Escola Estadual Doutor Pompilio Guimarães
e no Colégio Equipe, que é particular. “Acho que no primeiro momento, os alunos
não escolhem porque a própria família recrimina, a sociedade julga muito. Eu
tenho buscado ser um professor melhor, que inspire, que mostre que a profissão
é tão boa quanto qualquer outra, que tem desafio como qualquer outra”.

Araújo foi um dos vencedores do prêmio Educador Nota 10, em
2013. “É a forma que posso retribuir tudo que educação fez por mim. Venho de
família humilde. Meu pai é ex-presidiário e minha mãe era doméstica. A
oportunidade que eu tive foi graças à educação”.

Carreira pouco atrativa

O estudo elaborado
pelo Iede mostra que a carreira docente não atrai os alunos que têm um melhor
desempenho no Pisa. A avaliação internacional da Organização para a Cooperação
e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é aplicada a estudantes de 15 anos que fazem
provas de leitura, matemática e ciências. Entre os 70 países e regiões
avaliados, o Brasil ficou na 63ª posição em ciências, 59ª em leitura e 65ª em
matemática. Os estudantes que disseram que pretendem ser professores obtiveram
18,6 pontos a menos da média do país em matemática, 20,1 pontos a menos em
ciências e 18,5 a menos em leitura.

Dentre os países participantes do Pisa, a Alemanha é o que
apresenta a maior diferença entre a nota dos alunos que esperam ser professores
e a média geral do país. Aqueles que querem seguir a carreira docente obtiveram
42,9 pontos a mais em matemática, 52,5 em ciências e 59,1 em leitura.

Os países com os maiores percentuais de estudantes que querem
ser professores são Argélia, onde 21,7% dos estudantes querem ser professores,
e Kosovo, onde esse percentual chega a 18,3%. Nesses países, no entanto, o
desempenho desses alunos não é bom, “mas é muito similar ao desempenho
geral dos estudantes do país, que é baixo”, diz o estudo. Coreia e a
Irlanda estão também entre os países com os maiores percentuais,
respectivamente 13,8 e 12,6%. Ao contrário da Argélia e Kosovo, o desempenho
dos alunos é bom, chegando, na Coreia, a ser superior à média nacional.

“O que o dado brasileiro revela é o fato que a ocupação de
professor está com problemas de atratividade. As pessoas que têm notas mais
altas escolhem outras profissões”, diz o professor de economia da Universidade
Federal Fluminense (UFF) Fábio Waltenberg, um dos autores do estudo Ser ou não ser professor da
Educação Básica? Salário esperado e outros fatores na escolha ocupacional de
concluintes de licenciaturas
. Segundo Waltenberg, o salário é um
dos entraves para a escolha da profissão.

Equiparação salarial

Professores de
escolas públicas ganham, em média, 74,8% do que ganham profissionais
assalariados de outras áreas, ou seja, cerca de 25% a menos, de acordo com o
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
(Inep)Essa porcentagem subiu desde 2012, quando era 65,2%.

Por lei, pelo Plano Nacional de Educação, esse salário deve ser
equivalente ao de outros profissionais com formação equivalente até 2020.

De acordo com o diretor do Iede, Ernesto Martins Faria, três
aspectos contribuem para a atratividade da profissão. “Planos de carreira para
professores e educadores, ações específicas de valorização, que geram estímulo
e permanência, e coesão escolar. O funcionamento da escola tem a ver com visão
consistente, semelhante de gestor, coordenador pedagógico e educadores”, diz.

Segundo ele, o fato de os professores serem muitos e estarem
ligados a estados e municípios, muitas vezes com orçamentos restritos,
dificulta sobretudo a existência de planos de carreira atrativos. “Estamos
falando da carreira de 2 milhões de professores, [não apenas o Brasil], o mundo
sofre para oferecer uma carreira atrativa”.

Apesar das dificuldades, a estudante de licenciatura em ciências
sociais Aniely Silva, 20 anos, não desiste do sonho de ser, assim como Castro,
professora de ensino médio. Ela conta que a vontade ficou mais forte após
participar das ocupações de escolas em São Paulo. “Durante as ocupações das
escolas, percebi o quanto de informação não chega para nós, que somos de
periferia e de escola pública. Queria conseguir levar informação para as
pessoas. Quando a informação chega como conhecimento, muda a realidade das
pessoas, como mudou a minha”.

Aniely arremata: “Não escolhi a profissão pelo salário e não me
desmotiva. Quero estudar muito para ser muito boa no que eu faço e lutar para
melhorar a educação, por mais investimento e valorização dos professores”.


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