A mão de Deus entre os trovões

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 24 de agosto de 2017 às 17:38
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 18:19
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Era madrugada, dia 20 de abril de 2015, umas 4h30. Lá fora caia uma torrencial chuva.

Estava ancorado em uma pequena e muito charmosa baia da ilha de Culebra, território de Porto Rico.

Acordei com os fortes estrondos dos trovões e percebi que a chuva que começara ao cair da noite ainda se fazia presente, agora ainda com muito mais vigor. Fui ao banheiro e resolvi dar uma olhada lá fora.

Para meu total espanto e início de desespero vi, vindo na direção do Aleluiah, um veleiro que havia desgarrado da sua ancora. A bordo dele estava um casal de idosos que, atordoados pelo sono e a situação de extremo perigo, não sabiam o que fazer e andavam como baratas na hora que se acende a luz da cozinha pelo convés… Debaixo daquela água toda que caia.

Nesse mesmo segundo vi que o Lucas, um dos tripulantes a bordo na época, que dormia na sala, também acordou e eu falei: tem um barco vindo em nossa direção.

Sem pensar, nos jogamos na chuva e corremos para a popa do Aleluiah, no exato momento em que ocorreria a colisão. Estávamos nós dois ali e seguramos juntos a proa do Island Packet , que havia se desgarrado, com toda força que tínhamos e não tínhamos.

Desviamos o rumo dele e nesse momento seu capitão, Sr. Marley, com quem tive uma longa conversa na manhã seguinte, conseguiu ligar o motor e se livrar de colisões em outros barcos que ali estavam também.

Do segundo que abri os olhos, ir ao banheiro,  sair no convés, e correr para evitar a colisão, passou-se nem dois minutos.

Não tive tempo de pensar.

Mas depois fiquei pensando: será que existe coincidência, acasos… Tenho certeza que não. Acordei de um sono profundo, estava muito cansado na noite anterior devido à navegada de Porto Rico pra Culebra. Sorte?… Tampouco.

Acredito mesmo em um Poder Superior que, acima de todos nós, tudo vê e nos devolve exatamente o que plantamos. A tal da lei da ação/reação é muito real e implacável.

E por ela ou nos safamos ou nos ferramos.

… ainda que a tragédia estivesse para acontecer, no escuro, tarde da noite, debaixo de um aguaceiro que encobria a voz de qualquer grito ou buzina pedindo socorro, ao som de trovões e relâmpagos assustadores, se você tem saldo positivo, esse Deus maravilhoso vai te levantar e te colocar no lugar certo, na hora certa…. Agora,se seu saldo for negativo, ai meu caro, não adianta nem rezar na hora do aperto.

Pude ainda depois sentar no cockpit e apreciar aquele belo espetáculo da natureza, que mais uma vez me mostrara que nada, nada, naaada somos perto da grandeza desse universo e a força dos elementos da natureza.

Pensem bem antes das atitudes, ainda que suspeitas. Quanto mais as de pura maldade ou falta de caráter, em qualquer sentido, porque um dia o universo vai cobrar, e o pior…. em dobro.

Na manhã seguinte fui até o barco que havia desgarrado na madrugada.

Saiu para me atender um senhor muito simpático, que de nada lembrava aquele de horas atrás, totalmente em pânico. Senhor Marley, um canadense que com a esposa velejaram do Canadá até o Caribe, sozinhos, em um barco fantástico.

O Island Packet é bem conceituado no mundo náutico por ser um barco robusto, de excelente navegação e muito espaçoso por dentro. Tinha 36 pés, tamanho ideal para um casal.

Ele me contou que um gomo da corrente da sua âncora se partiu e eles estavam dormindo quando o alarme de arrasto soou. Porém, até entenderem o que estava acontecendo, perderam um precioso tempo, onde deveriam já dar partida nos motores para a sua própria segurança e dos outros barcos que ali estavam fundeados.

Acabei por dar uma carona pra ele no meu bote e fomos àcidade levar o lixo e comprar pão, Ficamos um bom tempo ali na padaria conversando sobre o assunto preferido de qualquer velejador: o mar.

Mais um amigo que ele, o mar, me deu.

Boa semana a todos.


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